Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Leitura obrigatória para jornalistas

As organizações Globo divulgaram no sábado (6/8), no Jornal Nacional, os seus princípios editoriais. Em um bloco inteiro do jornal, William Bonner e Fátima Bernardes resumiram o documento, dando uma pequena aula de conceitos de jornalismo ao telespectador. Para a grande maioria do público deve ter sido muito chato, apesar das numerosas trocas de câmera e inserções de infográficos, mas me despertou o interesse de ler o documento na íntegra, o que você também pode fazer clicando aqui.

O texto é muito bem trabalhado e, embora se destine ao público em geral, obriga o leitor a se lembrar de muitas coisas das aulas de comunicação. Mas como todo produto, os Princípios Editoriais das Organizações Globo contêm alguns erros e é sobre isso que irei falar.

O primeiro e mais fundamental deles: “O condicional só será usado quando a apuração não for suficiente para que o jornalista consolide uma convicção.” É um erro permitir o uso do condicional em qualquer situação. Se a apuração não permite afirmar com certeza um dado, ele deve ser suprimido. Por maior que seja a possibilidade de uma afirmação estar correta, a simples falta de provas já a impossibilita de ser publicada. Foram casos como esse que permitiram o uso dos condicionais e deram grandes lições de como não se fazer jornalismo, como o caso da escola base, em que donos de um colégio de ensino fundamental paulista foram acusados de abusarem de alunas, inclusive por veículos das Organizações Globo, e depois conseguiram provar sua inocência.

Leitura obrigatória

Outro erro presente no texto não chega a ser propriamente um crime, mas é algo arriscado.

Denúncias e acusações, feitas em entrevistas por pessoas devidamente identificadas, que desfrutem de credibilidade, seja pelo cargo que ocupam, seja pela história de vida, podem ser publicadas sem investigação própria, mas, necessariamente, acompanhadas pela versão dos acusados, de preferência no mesmo dia, quando estes se dispuserem a falar.”

O erro maior nesse caso é tornar o veículo, como os próprios Princípios dizem, um palanque de diversas opiniões políticas. Segundo os Princípios, jornalismo diverge de propaganda por estar numa eterna busca pela verdade sem prismas de interpretação, mas nesse item se permite a propaganda sem uma investigação que aponte a verdade.

Apesar disso o documento é interessante por apresentar uma definição nova de jornalismo, desvinculando-o dos estigmas da imparcialidade total e da verdade, tornando-os apenas objetivos que já se sabem, desde o início, inalcançáveis. Para as Organizações Globo, surge uma nova definição, muito menos questionável, do jornalismo, o produtor primário de conhecimento acessível de todos. E o documento vai mais além ao reconhecer o trabalho dos internautas em mostrar diferentes visões das notícias, muitas vezes engessadas pela prática profissional.

Os Princípios Editoriais das Organizações Globo são leitura obrigatória para todo jornalista, apesar de apresentarem falhas, das quais o jornalismo ainda não conseguiu se imunizar.

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[Bruno Bucis é estudante, Brasília, DF]