O livro Por Uma Vida Melhor, de Heloísa Ramos, foi distribuído pelo Ministério da Educação (MEC) em escolas públicas, após seleção efetuada por uma equipe da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Não conheço o livro entregue a 484.195 estudantes, mas, pelo trecho que vi reproduzido em jornais, não me surpreendo com o que a autora escreveu. Ela não incentiva o erro de português. Mostra as variações dos falares brasileiros e explica as regras que são exigidas pela norma culta ou linguagem formal. O “nóis vai” interiorano equivale ao “tu vai” do santista e do gaúcho. O emprego dessas formas coloquiais na presença de pessoas íntimas não é atestado de incapacidade verbal.
Certamente, quem domina a norma culta fará a concordância correta quando estiver em uma situação formal (falando ou escrevendo). Quem ainda não domina, precisará aprender, para poder usar o idioma como as regras gramaticais vigentes estabelecem. Do contrário, não saberá se colocar nos meios em que o padrão culto for dominante e correrá o risco de ser discriminado.
Esse livro não é o primeiro a enfocar o assunto. Na verdade, a maioria das publicações de língua portuguesa que conheço e utilizo apresenta as variantes dos falares brasileiros. Nem por isso deixo, ou deixei, de exigir de meus alunos ou de meus repórteres o emprego das regras gramaticais que regem o português culto. No entanto, quando estou diante de uma pessoa que não teve acesso à educação sistemática e que comete erros de concordância ou de pronúncia, não a discrimino, nem espero que ela tenha o mesmo domínio do idioma que eu esperaria de uma pessoa com escolaridade completa. Também não a considero menos capaz intelectualmente.
Imprensa precisa ler mais
O assunto merece um debate mais responsável do que o que vem sendo realizado pela imprensa. Do contrário, vai se repetir o festival de bobagens veiculado em 1990 (e nos anos imediatamente seguintes) depois que o então ministro Antônio Rogério Magri disse que o Plano Collor era “imexível”. Para que a polêmica arrefecesse, foi preciso que linguistas viessem a público em defesa da palavra inventada pelo então titular do Ministério do Trabalho. Na ocasião, até que gostei dos absurdos publicados sobre a criação daquela palavra. Foram úteis para mim. Pude enriquecer minha dissertação de mestrado, “Neologismos em Pauta – Os Jornais como Disseminadores e Criadores de Novas Palavras”, defendida em 2001 na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP).
A imprensa precisaria abordar questões linguísticas com mais conhecimento de causa. Minha sugestão é que leiam os livros: Preconceito Linguístico, de Marcos Bagno, publicado pelas Edições Loyola, e Preconceito e Intolerância na Linguagem, de Marli Quadros Leite, pela Editora Contexto. Vejam também a nota divulgada pela Associação Brasileira de Linguística(Abralin).