A promiscuidade entre certos setores da imprensa diária e organizações patrocinadas pelos partidos de oposição ao governo Lula chegou a um ponto de saturação inigualável a qualquer período da República brasileira. O mínimo que se pode dizer é que essa prática é um desrespeito àquela atividade profissional. Para os mais críticos, porém, essa ação prepara terreno para um futuro golpe de Estado.
É possível dizer que no Brasil de hoje o que sustenta a normalidade democrática é o sucesso da economia, que se mantém firme. Se não tivemos grande desenvolvimento econômico, pelo menos nos últimos quatro anos a pobreza diminuiu. Enquanto isso, a classe média, empobrecida por conta de modelos econômicos e políticos praticados por décadas, reclama por uma diminuição do Estado brasileiro, ao mesmo tempo em que pede maior participação do governo na organização social, rumo à diminuição dessas diferenças. Nesse contexto, é preciso analisar a atuação da imprensa na fiscalização e discussão de cada ato desse mesmo Estado, mas, para isso, é preciso um mínimo de seriedade e profissionalismo. É aí que essa promiscuidade apontada acima vira destaque.
Desde já – é bom que se diga –, o Estado não é somente a União, mas também as diferentes unidades da Federação e seus municípios, distribuídos por esse Brasil imenso. Onde anda, por exemplo, essa mesma imprensa que perde a vez não trazendo à tona os inúmeros problemas da rede de ensino estadual e suas conseqüências, como o seqüestro de contas bancárias dos endividados pais de filhos da classe média para com as escolas particulares? Onde anda essa imprensa cega que não enxerga a ação, nada discreta, de prefeitos como o da capital paulista, em sua ‘missão histórica’ de acabar com uma atividade centenária, como as feiras livres? Ao mesmo tempo, esse mesmo prefeito abandona o centro da cidade, entregue aos ratos, e os bairros mais distantes, a riachos mal cheirosos.
Pregação partidária
Nossa indignação, por outras vezes já apontada, é contra o jornalismo de fachada, de rastelo, como o alimentado pelo deputado Augusto de Carvalho (PPS-DF), presidindo uma organização denominada ‘Contas Abertas’. Ele a criou para manter e ampliar sua base eleitoral, com o objetivo – ‘missão’, em suas palavras – de fiscalizar os atos dos governos. Mantém nessa organização um quadro de funcionários que têm como única finalidade criar constrangimentos ao governo federal. Essas ações resultam em enfadonhos relatórios sobre os diferentes órgãos da União, que vão desde o volume de dinheiro gasto com fotocópias, até recursos gastos com a queima de material já considerado vencido, tais como formulários, rascunhos e diversos.
Assuntos, como se vê, da maior importância para o jornalismo brasileiro. Na simbiose dessa união entre oposição e certos setores da imprensa surgem cases, ou peças ditas jornalísticas, que não passam de verdadeira campanha desmoralizadora do atual governo federal. Como se não houvesse pautas mais relevantes a serem debatidas, esses relatórios se multiplicam, diariamente, sem um ‘ai’, como diria José. Pior, essas ‘informações’ são distribuídas e publicadas, regularmente, por jornais como a Folha de S.Paulo e, em outros, como matéria-prima de furos jornalísticos.
Ao ganhar as manchetes, esses cases vão municiando uma campanha, nem tão silenciosa, para a preparação de um golpe que virá pelas urnas ou… Não importa. No Brasil de hoje, quando a Polícia Federal arrebenta esquemas de alta corrupção, atingindo, inclusive, o Judiciário, é de se perguntar se essa prática de jornalismo de rastelo não é – como diria o jornalista conservador Boris Casoy – ‘uma vergonha’. O leitor é enganado porque é subtraída dele a origem da informação que é publicada.
O leitor precisa saber o que isso não é jornalismo, mas pregação partidária. Essas informações não podem ser ocultadas do cidadão, que paga uma assinatura de jornal impresso ou assina um provedor, como o UOL, por exemplo. No escamoteio em que essas notícias são montadas, o leitor chega a acreditar tratar-se de uma ‘fonte’ isenta, científica, confiável. Não é. ‘Contas Abertas’ é uma organização de apoio a atividades partidárias e que precisa ser identificada no corpo das dezenas de notícias por ela fabricadas. Também seria oportuno esclarecer quais os recursos financeiros que a fazem subsistir, a exemplo do que fazem as fundações Perseu Abramo e Mário Covas e o Instituto Sérgio Motta, que são mantidas com fundos partidários.
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Dramaturgo, São Paulo, SP