A estruturação dos meios de comunicação promoveu a integração de cenários, a interdisciplinariedade, uma visão holística de fatos que até então ficavam subentedidos. O mundo passou a conectar-se por letras, símbolos, caracteres. Tudo está em toda parte, fatos que ocorrem em outro continente afetam a vida globalizada de qualquer mortal na face da Terra. Porém, com este enorme fluxo de informações, há um enorme esforço para manter a coerência e a continuidade ‘de uma boa reputação’ perante a mídia – vitrine global. As comunidades, cidadãos, seres humanos, hoje são melhores definidos por um substantivo: consumidores.
Afinal, tudo é produto da cultura – até a religião, qualquer que seja a proposta, deverá ao mesmo tempo atrair, acolher e sensibilizar. Um instrumento capaz de persuadir a ponto de criar uma necessidade real e imediata, uma ponte entre o ‘mundo cruel sem o produto’ e o ‘paraíso depois de adquiri-lo’. Contudo, ao forjar uma espera em que os consumidores-fiéis-seguidores estão imersos no universo filosófico e palpável das marcas e corporações, deve-se ter um enorme cuidado para em momento algum o discurso seja refutado, ou apresente traços contraditórios. Pois, muitas vezes, um produto ou uma marca é visto e vendido como um messias, incorruptível, e desta forma seus consumidores passarão a cobrar tais títulos.
Ingenuidade e romantismo
A Motorola, uma das corporações que infestou o mundo com seu ‘Hello’, é um exemplo clássico. O slogan ‘Hello Moto’ hoje soa como um mantra de pessoas descoladas, que usam seu ‘Moto Bacana’, seu ‘Moto Design’. No Brasil, a Motorola investe alto em sua imagem fashion. É uma das patrocinadoras master do ‘São Paulo Fashion Week’, sua assessoria está aos cuidados de Alice Ferraz (empresa de PR focada em moda www.aliceferraz.com.br) e, além disso, promove festinhas badaladas na House of Palomino (http://www.erikapalomino.com.br/erika2006/galpao/materia.php?id=76).
Como o hype desse momento é a responsabilidade social (praticada por Madonna, Angelina e companhia – ícones da indústria do luxo), a Motorola investiu e criou o ‘Moto Razr Red’. No site (www.joinred.com), é possível perceber a dimensão mercadológica-bizarra-hilária da coisa. Design to help eliminate Aids en Africa é a proposta do telefone celular superpoderoso.
Como um aparelho de telefone celular poderia ser projetado para ajudar a eliminar a Aids na África? Uma proposta um tanto irônica, subestimando a inteligência dos consumidores e dos que acessam tal conteúdo. Porém, certamente, muitos acharam a idéia fantástica, seduzidos pela ingenuidade e romantismo da proposta. Um dos aparelhos ‘Moto Razr Red’ é vendido por $69.99 e o mais curioso é que este produto eliminará a Aids na África com uma contribuição equivalente a menos de 10% do valor da venda – $5,00. Inacreditável.
Alto custo da reciclagem
Porém, esta campanha seduz o público que acompanha os passos de Angelina no Camboja, o público que consome luxo e efetivamente não está muito preocupado com o termo ‘sustentabilidade’, que engloba eficiência econômica, eqüidade social e prudência ecológica. A Motorola terá esses valores descontados de seu imposto fiscal e ainda levará fama de ‘boazinha’. Assim, venderá mais por isso. Nos termos de mercado uma empresa como a Motorola, é chamada de ‘verde do dinheiro’, por propagar princípios relacionados ao verde da sustentabilidade (green market), mas na verdade usa como estratégia de venda.
A Motorola não é a única que participa da campanha Red, liderada por Bono Vox e apoiada fortemanete por Oprah Winfrey. Marcas como: GAP, American Express, Emporio Armani, All Star Converse, e até a Apple com Ipods entraram nessa ‘luta’.
Ao olharmos o caso dos telefones celulares de uma maneira global, sem separar as partes do todo, chegaremos ao pior. Atualmente, os celulares são consumidos de forma descartével; nunca a troca de aparelhos foi tão grande. Os consumidores anseiam por aparelhos com o último design lançado. Em 2006, 20% dos mais de 80 milhões de celulares foram descartados no Brasil. O que era luxo, virou lixo.O que muitos não sabem é que a bateria dos celulares é composta por substâncias tóxicas e metais pesados. Esse material polui o solo, o ar e os reservatórios de águas subterrâneas, causando doenças fatais para o ser humano.
Do outro lado, os fabricantes não se preocupam em instruir o consumidor ao descarte adequado porque o custo da reciclagem desse material é muito alto e ainda nehuma empresa assumiu a responsabilidade de financiar um projeto – bem mais barato que o cachê de uma top para estampar a campanha. Contraditoriamente, essas empresas não medem gastos com publicidade e pesquisas de marketing. Com isso, vão deixar seus consumidores doentes. A pergunta é: quem estará preocupado em consumir celulares quando estiver morto ou com uma doença degenerativa? Nesse momento, o novo design não solucionará o problema para eliminar o câncer gerado pelos resíduos tóxicos.
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Jornalista com especialização pela Faculdade Cásper Líbero em Jornalismo Multimídia na Pós-Modernidade