Cada vez mais são criados coletivos de mídia alternativa ou independente, especialmente de 2013 para cá. Costumam surgir a partir da crítica à concentração econômica e à hegemonia conservadora nos meios de comunicação. Em certo sentido, enquanto existem são eles essa própria crítica em seu necessário momento afirmativo, prático e concreto. Ou seja, ao narrar os acontecimentos da vida sob outras perspectivas (e a partir de outras preocupações), deixam claro os estreitos limites ideológicos presentes na grande mídia como um todo. Ao mesmo tempo, provam ser capazes de chegar a resultados de excelente qualidade jornalística, estética, informativa etc., mesmo sem todo o aparato produtivo dos grandes meios.
No entanto, após a empolgação inicial, mais cedo ou mais tarde todo coletivo chega ao dilema do financiamento para se manter: editais, publicidade, prestação de serviços, doações, crowdfunding, rifas, bingo? É verdade que, com muita dedicação, dá para se virar: banca o salário de um ou outro membro, remunera um ou outro frila, compra um computador e, com sorte, consegue uma salinha apertada em um prédio qualquer. De qualquer forma, temos aqui um primeiro grande entrave. Enquanto os governos perdoam dívidas fiscais e despejam milhões nas grandes corporações de mídia mensalmente, a nós restam algumas migalhas num salve-se quem puder típico da lógica liberal empreendedora.
Mudanças estruturais
Agora vamos imaginar que vivêssemos em outra realidade, com políticas públicas de fomento minimamente sérias voltadas à mídia alternativa. E que, em uma área como a região da grande Florianópolis (1 milhão de habitantes), fosse possível existirem três coletivos com cinco profissionais remunerados de acordo com os pisos das categorias, trabalhando com bons equipamentos em um ambiente adequado, publicando diariamente materiais de qualidade em seus portais de internet. Será que dá para visualizar uma disputa real com conglomerados como a RBS, a Rede Globo? Até que ponto não superestimamos nossa capacidade contra-hegemônica de luta através das, tão em voga, narrativas, especialmente nas “redes”? Mesmo nessa situação hipotética de relativa profissionalização dos coletivos, a Globo continuaria detendo propriedades cruzadas e dominando o consumo de informações não só na internet, como também no rádio, nos jornais e revistas e nas TVs aberta e fechada. As novelas e o futebol seguiriam sendo assistidas nos canais de sempre. Os grandes meios seguiriam detendo a produção e, ainda mais importante, a circulação dos conteúdos, além da mesma envergadura para fazer política e ditar a agenda nacional.
Por isso, se nos contentarmos em ser apenas um instrumento auxiliar das mais diversas lutas, ou um simples espaço (remunerado ou não) de convergência de jornalistas desconfortáveis com a grande mídia, desperdiçamos nosso potencial político de sujeitos diretamente interessados em avançar na luta pela democratização da comunicação. A mídia alternativa é importante, necessária e realmente já mostrou ser capaz de incidir na conjuntura vez ou outra. Mas fazê-la existir é só o primeiro passo (de outros possíveis) depois da saída do conforto da crítica acadêmica. O segundo, e decisivo, está em articular esses coletivos na luta por mudanças estruturais no sistema de comunicação brasileiro.
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Matheus Lobo Pismel é jornalista do coletivo Maruim e coautor do livro Colômbia: movimentos pela paz (2014)