Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Milagre. Mídia livra-se de dogmas e silêncios


Veja continua surpreendendo. Novamente rompeu o pacto e está fazendo barulho na Zona do Silêncio. As duas páginas que dedicou à figura e à obra do padre mexicano Marcial Maciel (‘Legionários do Anticristo’, edição 2164, págs. 100-101) mostram que algo se move no semanário da Abril. Na direção correta.


A Folha de S.Paulo não ficou atrás – ao contrário, foi além, embora adotando diapasão mais sutil. No domingo (9/5, pág. A-20), com chamada de capa, publicou matéria de página inteira sobre os erros dos Vaticano no acobertamento dos crimes de pedofilia. O denunciante é o premiado jornalista americano Walter Robinson, que acompanha o assunto desde 2002 (ver ‘`Vaticano encara denúncias de uma maneira errada´‘). Dia seguinte, segunda (9/5), outra página inteira desta vez com o filósofo americano Daniel Dennet, ‘um dos mais articulados defensores do ateísmo de inspiração científica’.


Submissão cega


Serão indícios suficientes para indicar um avanço jornalístico concreto, substantivo? A matéria de Veja está atrasada quatro anos, a denúncia de Walter Robinson tem origem em fatos acontecidos há oito. São casos isolados, é verdade, mas é preciso levar em conta que a grande imprensa brasileira está há quase duas décadas enredada na Opus Dei (e seus prepostos) aplicando a estratégia do silêncio e da mistificação implantadas desde 1536 em Portugal e no Brasil.


Não esqueçamos jamais que a Opus Dei determinou um embargo no noticiário das comemorações sobre os 200 anos de fundação da imprensa brasileira simplesmente porque o seu fundador, Hipólito da Costa, era maçom e foi preso pela Inquisição lisboeta, em 1802. Bendita prisão: graças a ela nossa imprensa começou livre da censura – porque o primeiro veículo a circular no país era impresso em Londres.


Indícios não são evidências, são sinais, indicadores, podem ser descontinuados. Mas ao alinhar-se com a imprensa mundial e deixar de andar de costas, pelo menos nesta cega submissão às alas conservadoras e reacionárias da igreja católica, nossa mídia adota parâmetros intelectuais contemporâneos e dificilmente reversíveis.


Tudo pode acontecer. Estes pequenos milagres são a prova disso.


 


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