Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Nova comunicação do governo: já era

A jornalista Fátima Gonçalves assumiu a Coordenadoria de Comunicação Social do governo do Pará prometendo colocar em prática um projeto bem profissional: informaria abundantemente (como continua a ser feito) a imprensa sobre os atos oficiais (e, mais do que sobre eles, numa administração petista: sobre as intenções e promessas). Manteria, porém, certa distância do governo para poder funcionar com competência no leva-e-traz entre o poder e a sociedade.

Quando fui convidado para fazer uma palestra para toda a equipe da Coordenadoria, em pleno Palácio dos Despachos, com alguns aderentes na platéia, mas sem a presença da governadora Ana Júlia Carepa, fiquei feliz. Voltei à sede do governo, onde raramente pus os pés, e falei o que quis, ouvindo o que meus questionadores quiseram perguntar, à vontade, num ambiente descontraído, favorável à liberdade de expressão.

Mas ao invés de o projeto começar a tomar forma na direção sugerida, foi levado à fritadeira e torrado até virar nada. Agora há um novo projeto em curso, cujo conteúdo ainda se desconhece, mas não a ponto de não se saber algo elementar: nada tem a ver com o anterior. Se alguém tinha dúvida, a ‘mudança-da-mudança’ já foi declarada. E os primeiros agentes da primeira mudança foram logo mandados passear em outro terreiro. Fátima Gonçalves ainda está lá, mas rebaixada à condição de gerente, uma função condenada à efemeridade. Logo, o que prometia ser sólido se terá desmanchado no ar viciado dos ambientes soturnos.

Com esse ziguezague retilíneo, o PT confirma no Pará sua matriz de grupo confessional, irmandade dogmática, confraria fechada. Nessas estruturas as pessoas caem em desgraça ou são reabilitadas sem conhecer as causas reais da sua subida ou da queda. A linguagem é simbólica e as motivações são obscuras. Há sempre gente brilhante envolvida nessas maquinações, mas quando os mecanismos são postos em funcionamento o que deles resulta costuma surpreender e chocar pela contradição entre a origem e o resultado, entre o que se diz e o que se faz.

Foi assim que aconteceu com a luminosa geração de bolcheviques a partir da revolução russa. No final da embrulhada, ou da sua parte mais terrível, os comunistas giravam desnorteados atrás do famoso relatório secreto de Kruschev sobre os crimes de Stálin, meio século atrás. Precisavam de um novo eixo. O da véspera perdera qualquer utilidade.

Faço a referência porque há novos turcos e apparatchicks convocados para formular e executar a ‘nova política de comunicação social’ do governo do PT. Talvez essa novidade nunca se materialize como uma verdadeira política. Nem se haverá de saber o que provocou o cancelamento da anterior, ainda nas preliminares. Mesmo porque as palavras escondem a verdade, ao invés de expressá-la. Mas é bem sintomático que gente do pedaço, profissional testado na relação da comunicação oficial com a imprensa e a sociedade, seja substituída por santos inquisidores. A comunicação petista trumbicou.

Situação crítica

O governo imprimiu e recolheu uma revista de 16 páginas, impressa em cores, com papel de primeira, que devia registrar os primeiros 113 dias da administração Ana Júlia Carepa. O resultado não era mesmo de boa qualidade editorial. Mas a publicação abrigou uma denúncia muito grave: de que só no ano passado a previdência estadual acumulou um déficit de 475 milhões de reais. Para 2007 a previsão é de que esse buraco aumente 50%. Com o vermelho ultrapassando um bilhão de reais em dois anos, trata-se de uma bomba de efeito retardado. O cofre público vai estourar, ainda mais porque o novo governo diz que recebeu do antecessor dívidas de R$ 255 milhões e 99 das 143 prefeituras municipais que tiveram suas contas apuradas devem ao Estado.

Se o quadro é verdadeiro, o governo devia publicar urgentemente um relatório detalhando essa terrível situação, partilhando o drama com a população. Pelo menos assim lhe apresentará o motivo forte de haver pouco o que mostrar nesses 113 dias. Com ou sem revista de propaganda. Inútil e cara.

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Jornalista, editor do Jornal Pessoal, Belém, PA