Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Novo desaparecimento, outra cobertura

A espanhola Mari Luz Cortés, de cinco anos, desapareceu perto de sua casa, na cidade de Huelva, em 13/1. Os jornais noticiaram e a comparação com o sumiço da menina inglesa Madeleine McCann foi inevitável. Maddie, como é chamada, desapareceu de um quarto de hotel na Praia da Luz, em Portugal, em maio do ano passado. O caso, cheio de reviravoltas e sem nenhum avanço concreto, virou manchete – por meses – em todo o mundo.

A imprensa espanhola resistiu à tentação de apelidar Mari Luz de ‘Madeleine 2’, mas havia temores de que o verdadeiro circo montado após o desaparecimento de Maddie inspirasse algo similar na Espanha. Segundo a jornalista Lola Garán, ex-correspondente do jornal El País, ainda que não haja no país a tradição de tablóides sensacionalistas – como no Reino Unido –, os jornais e os programas de TV têm se tornado mais competitivos nos últimos tempos. Isso poderia dar à cobertura espanhola, antes comedida, um aspecto mais agressivo. De fato, jornalistas que batem ponto no resort da Praia da Luz viajaram até a Espanha para se inteirar do caso de Mari Luz.

Duas intensidades

Ainda assim, a cobertura do desaparecimento da menina espanhola não chega nem perto à dedicada ao sumiço de Madeleine. Em artigo no jornal britânico Observer, especula-se as razões para isso. Entre as conclusões, está a de que há menos mistério envolvido no caso espanhol. Os McCann, com sua aparente frieza – não choram em público, entre outras coisas – passaram a ser vistos com antipatia pelos portugueses e por parte da mídia. Quando foram tidos como suspeitos de um crime contra Maddie, a atenção sobre eles aumentou ainda mais. O mesmo não ocorre com a família de Mari Luz, considerada ‘normal’ por demonstrar o sofrimento com o sumiço da menina.

Outro aspecto que pode ter influenciado a cobertura é a origem das duas famílias. Os McCann são o estereótipo da família perfeita – os pais, além de fotogênicos, são médicos. O angelical rosto de Maddie estampado por toda a parte nos últimos meses se tornou um retrato perfeito para uma tragédia familiar. Os Cortés, entretanto, são uma família de ciganos que vêm de um bairro pobre onde drogas e crimes são problemas correntes. Há inclusive quem acredite que o desaparecimento de Mari Luz esteja ligado a uma disputa entre duas famílias.

Para Macarena Orte, que produziu um especial de TV sobre Maddie, a explicação é ainda mais simples. ‘No caso de Madeleine, a família tem acesso a muito dinheiro. Em Huelva, eles são ciganos e não têm o dinheiro suficiente para montar uma campanha de marketing e garantir que a história esteja o tempo inteiro nos jornais e na televisão’, resume.

Campanha

Os Cortés, entretanto, têm aprendido algumas lições com os McCann. ‘Eles fizeram broches com o rosto da menina e um número de telefone. Há pôsteres em todo lugar e um sítio com uma conta bancária onde você pode contribuir nas buscas por Mari Luz’, enumera Manuel Albert, repórter local que tem coberto o caso. A campanha ainda é bem menor que a do casal britânico, mas a família espanhola tem realizado uma coletiva de imprensa na frente de casa todos os dias, o que certamente prende a atenção dos jornalistas locais.

Infelizmente para a família de Mari Luz, a cobertura sobre crianças desaparecidas – quando os meses passam e não se chega a uma conclusão – costuma ser esquecida. Apenas na Espanha, há 200 casos em aberto de crianças desaparecidas. Segundo a jornalista Rocío Ríos, da emissora de TV Antena 3, o amplo destaque do caso de Maddie foi exceção. ‘Fizemos alguns programas sobre os McCann, mas porque Madeleine foi a grande história de 2007; enquanto esqueceremos do caso de Huelva muito em breve’, diz ela, lembrando do desaparecimento de um pequeno menino chamado Yeremi poucas semanas antes do sumiço de Maddie, nas Ilhas Canárias. ‘Quem ainda fala dele?’. Informações de Paul Hamilos [The Observer, 27/1/08].