Foi legítima a publicação em todos os grandes jornais de capas promocionais (pagas em última análise pelo contribuinte), em comemoração ao bicentenário do Banco do Brasil?
Os jornais que publicaram a matéria paga fizeram algum tipo de investigação ou simplesmente alugaram sua página mais nobre para veicular um fato histórico recheado de dúvidas e reticências?
A verdade é que o Banco do Brasil teve várias fundações e refundações. Sua história não é linear como a da imprensa brasileira – que recentemente também completou 200 anos. Como lembra o professor Orlando de Barros, do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), é preciso descontar os anos que vão entre 1829, quando o BB foi liquidado, e 1851, quando o Barão de Mauá o recriou e assim mesmo como banco privado, cuja marca estava ali para ser aproveitada.
O governo o endossou dois anos mais tarde, promovendo a fusão com o Banco Comercial do Rio de Janeiro. Portanto já se pode descontar 23 ou 25 anos, conforme o critério escolhido. Depois, o BB foi praticamente desativado com a concordata de Mauá, em 1875.
Retornou do sono letárgico nos anos 90 do século 19, mas só recebeu amparo da nova República em 1908. Daí em diante sua trajetória é nítida, sem lapsos. O bicentenário reduziu-se a algo próximo de um sesquicentenário.
Comemoração arquivada
Esta mesma imprensa que participou da orgia publicitária do domingo (12/10) recusou-se a comemorar o seu próprio bicentenário, embora sejam incontestes os três fatos relacionados com a sua fundação:
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A Impressão Régia foi comprovadamente criada em 13 de maio de 1808 e o país finalmente entrou na Era Gutenberg depois de 308 anos de embargo eclesiástico e 272 de censura inquisitorial.**
O Correio Braziliense foi impresso em Londres com a data de junho de 1808 e o seu primeiro texto está assinado por seu fundador, Hipólito da Costa, com a data de 1º de junho de 1808. Foi o primeiro jornal livre de censura a circular no Brasil e em Portugal.**
A primeira edição da Gazeta do Rio de Janeiro foi lançada em 10 de setembro de 1808 e, embora tenha trocado de nome, nunca perdeu a sua característica de jornal oficial (na primeira fase, ‘terceirizado’).Apesar de tantas certezas, nossa imprensa arquivou a sua efeméride. Envergonhou-se de algo, antes ou depois da sua fundação. Se o Banco do Brasil ou Caixa Econômica pagassem alguns trocados a festa certamente não seria clandestina.
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