Quando pintou a estultice do Conselho Federal de Jornalismo (um monstrengo natimorto, por vir à luz já mumificado, coitado), quem primeiro botou a cara na telinha da Globo (Jornal Nacional) para defender a coisa com barbas, unhas e dentes foi o presidente nacional do PT, José Genoíno.
O mesmíssimo José Genoíno assinou o artigo ‘Colunismo político e julgamento moral’ na Folha de S. Paulo (13/09) [remissão abaixo], em sua mui nobre página 3 (‘Tendências/Debates’). O texto é uma horrorosa e de péssimo gosto diatribe contra as colunas políticas (e, portanto, contra seus respectivos titulares), satanizando-as em razão de (sic) sua mania em promover julgamentos morais dos entes colunáveis.
Como se vê, o companheiro Genoíno anda preocupado com a imprensa, a ponto mesmo de patrulhá-la sob a arriscada e perigosa ótica da moral. E, por extensão, dos bons costumes. Deixemos de lado quaisquer semelhanças do DNA de tal raciocínio com aquele de tempos assim mais plúmbeos, nos quais o citado companheiro foi submetido, sem anestesia, à moral vigente. Moral política, diga-se logo, da mesma forma que o moralista artigo do reabilitado e anistiado companheiro poreja política desbragadamente.
A diferença, digamos, temporal, dos dois contextos reside no fato de que José Genoíno, na fase Araguaia, foi exemplado em nome do regime militar, enquanto, na fase contemporânea, chama a si o dever de exemplar os outros – no caso jornalistas-escrevinhadores-de-colunas-políticas – em nome do regime ora no poder, do qual faz parte. E justo jornalistas, que em sua esmagadora maioria, sempre lhe deram a maior força.
Máquina do tempo
Coisas da vida. Mesmo assim, vamos lá: que diabos de moral tem o presidente do Partido dos Trabalhadores, ou seja lá de qualquer outra agremiação assemelhada e/ou concorrente, daqui ou do Gabão, para irromper no telejornal de maior audiência do país para defender o nefasto CFJ?
Mas este não era cria da Fenaj? Todo o governo não saiu, sôfrego e moralista (o próprio presidente da República tratou de definir os jornalistas como covardes) a afirmar tal paternidade lavando as mãos, cheio de dedos e não-me-toques? Se bem que outro dia uma coluna de um dos nossos jornalões (dessas que andam tirando o sono do companheiro Genoíno) registrou o fato: um prócer do Planalto desmentiu de alguém a tese segundo a qual a idéia do CFJ seria do governo Lula, declarando candidamente que a mesma é produto do Ministério do Trabalho (o daqui mesmo, não o do Gabão).
Voltando ao moralmente ofendido companheiro Genoíno, quer dizer então que é moralmente aceitável que um partido político, justo aquele que se aboletou no poder, saia a público, pela TV, para defender um desavergonhado instrumento de censura? Se não, por que o companheiro Genoíno não abdicou da aparição televisiva e global, em horário nobre, cedendo o lugar – ou melhor, a audiência – a quem de direito? Se é que se pode falar em direito numa hora dessas.
Qual será o próximo passo do xerife mediático José Genoíno? Listar as colunas políticas de acordo com critérios (os seus) morais? Estas se fariam assim em ‘boas’, ‘más’, ‘benignas’, ‘malignas’, ‘virulentas’, ‘vitaminadas’, ‘envenenadas’, ‘celestiais’, ‘pornográficas’, ‘espiritualistas’, ‘agnósticas’ e que tais?
Sugerirá, num surto de originalidade jornalística, a encampação (via BNDES, óbvio), de algum dos nossos combalidos jornais, rebatizando-o com o nome de Pravda, com direito às importantes e moralistas presenças de Fidel Castro e da múmia de Lênin, festa de arromba embalada pela edificante parceria (e de altíssimo teor moral) Zezé de Camargo e Luciano/Banco do Brasil?
Ou, numa atitude assim mais moralmente arrebatadora, se autonomeará um ínclito, vigilante e patriótico PMCPB (Pauteiro-Mor das Colunas Políticas Brasileiras), em nome da preservação da moral comunicadora? Caso no qual certamente o colunista (ou a colunista) que ousar sair da linha será condenado(a) a uma temporada num centro de reeducação profissional baseado no aprazível e próximo Cariri cearense. Afinal, apesar de vetusto, o Sucatão precisaria fazer as vezes de uma máquina do tempo para remeter os(as) indisciplinados(as) colegas para o Gulag, que por sua vez é (ou foi) longe pra caramba.
A quantas anda?
Mas deixemos de lado a moral piegas e surpreendentemente autoritária de José Genoíno. O fato, de capital importância para colunistas políticos e demais profissionais do jornalismo, é que este governo já deu mostras de sobra que não suporta e idéia de uma imprensa livre e soberana.
O moralista José Genoíno apenas acaba de confessar que abriu o bico. Não agüentou o tranco. Justo ele, que por tantos anos plantou (com uma produtividade de matar de ódio as improdutivas cabeças do MST) notinhas e fofocas em colunas Brasil afora. Justo ele, que se fez respeitável expert em obstruir pautas apenas para impedir o governo dos outros de andar.
Se o negócio é moral, conviria à vestal do PT anotar que a única ocorrência neste mister digna de nota na atualidade brasileira foi o nivelamento, rápido feito um raio, do seu PT aos outros partidos brasileiros. Outro parâmetro moral à disposição: consultar (nem precisa recorrer ao DIP, DOPS, KGB ou a qualquer outra sigla defunta capaz de tanto encantar o PT) a quantas anda o prestígio destes partidos (e dos políticos, portanto) junto às galeras brasileiras. Vale uma comparação com, por exemplo, a Igreja, as Forças Armadas e, com todo o respeito, a imprensa.