Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O feminismo da candidata

A presença da governadora do Alasca na chapa republicana teve um efeito devastador nos noticiários, programas femininos, programas humorísticos e especialmente nos programas políticos da TV americana. Só se falava em Sarah Palin, candidata à vice-presidência na chapa de John McCain. As pesquisas mostravam melhoras na performance dos republicanos e a governadora prometia ser o grande tema da mídia até as eleições. Mas aí veio a crise de Wall Street e o encanto da candidata perdeu um pouco do apelo.


Mas antes ceder o lugar no noticiário para a crise, Palin promoveu uma discussão que teria poucas chances na mídia brasileira: que tipo de feminismo ela representa?


‘Palin marca o retorno ao feminismo clássico’: esse era o título destacado do USA Today (16/9/2008). A matéria mostra duas visões diferentes do papel de Palin nas eleições. De um lado, o apoio à candidata e às idéias que ela defende:




‘Que timing perfeito. No momento em que celebramos 88 anos da conquista do voto pelas mulheres, surge Sarah Palin, destruindo 40 anos de ortodoxia feminista em duas semanas. Não é de admirar que algumas feministas a odeiem. Palin recupera a posição histórica e o sentimento coletivo das primeiras sufragistas, como a primeira candidata americana à presidência da República, Victoria Woodhuli, que era contra o aborto. Uma coisa fica clara nessas eleições: as mulheres americanas não são uma massa monolítica e não pensante que pode ser manipulada. O feminismo clássico é pró-mulheres e pró-vida’.


Boas chances


Do outro lado, na mesma edição do USA Today, as feministas que não gostam da governadora do Alasca dizem:




‘Anos atrás, o mercado descobriu a força das mulheres em número e voltou para elas as campanhas publicitárias. Agora, com o futuro do nosso país em jogo, e com o sucesso da candidatura de Hillary Clinton, os republicanos vêem o poder das mulheres para ganharem esta eleição. Assim eles escolheram uma `saia´ como sua candidata a vice-presidente. Com a escolha de Palin, os republicanos insultaram as mulheres e o feminismo. Palin é uma virtual garota de pôster cujo apelo, ironicamente, é para os homens: ela é uma animadora de torcida, uma fã de armas, uma militante anti-aborto e membro da direita religiosa. Esta não é a mulher por quem as feministas têm esperado. Mesmo assim, ela é mulher e tem apelo para aquelas pessoas que pensam que ter uma mulher na Casa Branca é um progresso. O mais assustador é que as crenças de Palin são a antítese de tudo pelo que as feministas têm lutado. Palin é contrária ao aborto mesmo nos casos de estupro ou incesto. Esta mulher levaria o feminismo a um retrocesso de cinqüenta anos’.


A governadora do Alasca, que aparece nos anúncios de TV atacando Barack Obama e faz questão de levar a família inteira (inclusiva filha grávida e solteira junto com o namorado) aos comícios, não mostra a menor preocupação em situar-se como feminista ou não. O importante, para ela, é dizer, em todas as entrevistas, que, apesar de ter vindo do Alasca, tem capacidade para ser governadora e vice-presidente. E a imprensa complementa, de uma forma que seria difícil ocorrer no Brasil, o que ela não diz: as chances de que Palin venha a ser presidente são grandes, pois McCain, se ganhar, será o presidente mais velho da história dos Estados Unidos.

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Jornalista