Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O futuro da comunicação de governo

‘Para o Brasil seguir mudando.’ Esse foi o lema da campanha de Dilma Rousseff à presidência da República. A então candidata petista transmitiu ao país a ideia de que, eleita, manteria o país no mesmo caminho seguido pela administração do seu companheiro Lula. É fato que a maioria das ações do antecessor deva ser mantida, como as das áreas de infraestrutura, habitação e social. Mas o slogan de campanha da candidata vitoriosa não serve para a comunicação social do governo federal. A presidente eleita terá que mudar totalmente essa área, vinculada diretamente ao Palácio do Planalto, que só piorou nesses oito anos de Lula em relação às duas gestões de Fernando Henrique Cardoso.

Nos debates que travou com o opositor José Serra (PSDB) durante a campanha presidencial, Dilma repetiu à exaustão que adotaria uma política de valorização do servidor concursado. A promessa está gravada na memória do eleitor. Na internet, também há dezenas de vídeos com frases e compromissos nessa linha, firmados pela então candidata. A mim, por ora, só interessa saber como ficará a Secretaria de Comunicação Social do Palácio do Planalto (Secom): se o jornalista Franklin Martins será mantido no comando, ou se a presidente eleita indicará para o cargo a jornalista Helena Chagas, um dos seus braços direitos durante a campanha eleitoral, ou outro profissional.

O único fato concreto é que do jeito que está não pode ficar. A Secom andou para trás na gestão de Franklin Martins, jornalista de currículo invejável que, definitivamente, não se deu bem na função de condutor da comunicação governamental. O órgão jamais tomou para si a responsabilidade de por em prática política de comunicação que abrangesse todo o governo. Limitou-se a cuidar da distribuição da verba de publicidade.

Assessorias isoladas

Com Martins, a Secom abusou do direito de fazer licitações para contratação de serviços de necessidade duvidosa. Foi o caso, por exemplo, do processo para contratar empresa de relações públicas, ao custo de R$ 15 milhões, para divulgar a imagem do Brasil no exterior. Isso quando o país era governado (e ainda é) pelo ‘Cara’. Quem tem o ‘Cara’ não precisa de outras formas para vender ao mundo suas potencialidades. Dinheiro jogado fora.

Definitivamente, a Secom no governo do presidente Lula não teve o desempenho esperado. Pelo menos aos olhos de quem acreditou que Martins fosse, de fato, revolucionar a comunicação do Executivo federal. Esperava-se que o discurso fosse dar lugar à prática. Que nada. O que Martins mais fez foi assinar extratos e mais extratos para licitar vários serviços da área, mesmo tendo à sua disposição verdadeiro batalhão de jornalistas, relações públicas e marqueteiros nomeados sem concurso. Nunca na história da Secom se gastou tanto recurso público com terceirização dos serviços.

Enquanto isso, a comunicação, no governo como um todo – e não apenas no Palácio do Planalto – não se deslanchou. Aliás, piorou. E muito. As assessorias de comunicação nos ministérios, por exemplo, continuaram isoladas, sem norte, sem uma política integrada, com profissionais concursados mal-remunerados, entregues à própria sorte.

Recado claro e direto

Com Martins, os ministros continuaram bem assessorados. Em média, cada ministro dispõe de cinco assessores de imprensa. Todos esses profissionais, frise-se, nomeados livremente, sem concurso, com salário que varia de R$ 7 mil a R$ 12 mil. Alguns têm direito a auxílio-moradia. Outros engordam seus salários participando de conselhos de empresas estatais.

No entanto, a busca pela qualidade dos serviços de comunicação nos órgãos da administração federal, voltados à população, manteve-se afastada dos projetos do titular da Secom. Martins nunca voltou seus olhos, sua atuação, para a comunicação dos ministérios. Ateve-se tão somente à dos ministros. Esses, sim, privilegiados, com assessores trombando um no outro pelos corredores dos ministérios.

A ideia de reestruturar a única carreira de comunicação social do governo federal, a de Técnico em Comunicação Social, foi rechaçada pela Secom. Pior: por meio de assessores, Franklin Martins mandou recado claro e direto aos responsáveis pelo movimento, como jornalistas e relações públicas concursados: ‘Procurem o Ministério do Planejamento porque a Secom vai criar sua própria carreira.’

Mudanças históricas

A carreira que a Secom de Martins quer criar, a de gestor em Comunicação Pública, traz atribuições idênticas às do Técnico em Comunicação Social. Puro capricho. A diferença é que, na nova carreira, os salários serão quatro vezes maiores que a remuneração da carreira já existente.

Se a presidente eleita Dilma Rousseff for colocar em prática, de fato, sua promessa de campanha, de valorizar os servidores públicos de carreira, a tal ‘meritocracia no serviço público’, a primeira providência a ser tomada na área de comunicação é trocar o titular da Secom. Afinal, a ideia de Martins sobre os profissionais concursados não bate com a de Dilma. Não há qualquer semelhança. Eles pensam de forma diferente. Mais que escolher bem o seu ministro da área de comunicação, a futura presidente terá que adotar postura totalmente diferente da do seu antecessor. Lula confiou demais em Martins. E não percebeu que o jornalista deu de ombro às mudanças históricas que pedem e pediam a comunicação do governo.

Legado negativo

Lula terá passado oito anos no cargo de presidente sem que a área de comunicação tenha registrado centímetro sequer de melhoria. Os profissionais da área de comunicação continuam sem plano de carreira, tratados com desprezo pela Secom. Não se cogitou criar uma política única de comunicação para os órgãos federais.

Que o futuro secretário de Comunicação Social da presidente eleita não tome posse literal do cargo achando-se acima de tudo e de todos. Que saiba ao menos reconhecer que a estrutura de comunicação do governo federal é precária, mais em função do improviso de suas ações, com a contratação temporária de profissionais da área de comunicação, do que propriamente pela falta de suporte financeiro.

Martins não deixará boas lembranças. Ele até que teve início promissor no comando da Secom. Mas parou por aí. Seu legado será lembrado mais pelo lado negativo. Teve tudo nas mãos para transformar a comunicação de governo. A única imagem que ficará do experiente jornalista é a de um comandante que se preocupou apenas com o hoje, desprezando o amanhã e o depois.

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Jornalista, técnico em comunicação social do Executivo federal, Brasília, DF