Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O jornalista e o assassino

Há notícias que são de interesse público e há notícias que são de interesse do público. Se a celebridade ‘x’ está saindo com o ator ‘y’, isso não tem nenhum interesse público. Mas, dependendo de quem sejam ‘x’ e ‘y’, é de enorme interesse do público, ou de um certo público (numeroso), pelo menos.

As decisões do BC para conter a inflação têm óbvio interesse público. Mas quase não despertam interesse, a não ser dos entendidos.

O jornalismo transita entre essas duas exigências, desafiado a atender as demandas de uma sociedade ao mesmo tempo massificada e segmentada, de um leitor que gravita cada vez mais apenas em torno de seus interesses particulares.

Um caso como a tragédia de Realengo reúne interesse público e interesse do público em grau máximo. Como combater a circulação de armas no país? Como aumentar a segurança nas escolas? Como enfrentar o problema do bullying? São questões de interesse público e de interesse difuso do público.

Exposição apelativa

Aquém delas, porém, há o fato trágico. Como fazer sua cobertura? Até onde saciar a curiosidade (mórbida) das pessoas? Até onde devassar o sofrimento das famílias? Deve-se expor sem limites os vídeos ‘preparatórios’ do assassino? Deve-se preservar as crianças disso tudo? Até que ponto? E como?

Não há respostas conclusivas a essas perguntas. Mas não fazê-las, sob pretexto de que seriam ingênuas numa época de informação instantânea, equivaleria a deixar o jornalismo e suas opções fora do debate público. É preciso refletir melhor sobre os nossos critérios.

Sobretudo quando o jornalismo se converte em infotainment e parece inclinado a se guiar quase exclusivamente pelos interesses ‘do público’. A superexposição midiática, apelativa e, afinal, monótona do assassino serve bem de exemplo. Nunca um vídeo foi tão visto e comentado. É contra esse espetáculo que deveríamos nos opor. Mesmo, ou principalmente, que isso nos pareça uma batalha perdida.

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Jornalista