Muito mais do que um extraordinário fenômeno editorial, a repercussão do livro do jovem economista francês Thomas Piketty – O capital no século 21 – tem a ver com o seu inspirador, Karl Marx, e com os preconceitos que o filósofo alemão desperta nas elites econômicas e políticas há 137 anos, quando publicou o primeiro volume do O Capital, a obra mais proibida dos últimos séculos.
Mas o que alavanca o entusiasmo em torno de Piketty, tornando-o instantaneamente uma estrela de primeira grandeza no cenáculo mundial, são as conclusões que procurou comprovar cientificamente: Marx está correto, as desigualdades tendem a eternizar-se, na medida em que a riqueza mantém-se sólida, não se distribui.
Piketty não é um carbonário, é um marxista moderado, militante do Partido Socialista francês, que está sendo recebido com o maior respeito por publicações notoriamente conservadoras como o Wall Street Journal e The Economist, este do mesmo grupo que edita o Financial Times, que tenta corrigir suas premissas e estatísticas. Em vão.
A chave final para explicar o fenômeno Piketty é a afirmação nas primeiras páginas da introdução: “A economia é algo sério demais para ficar exclusivamente nas mãos dos economistas e cientistas sociais”. A economia concerne a todos. Piketty está parafraseando o político francês George Clemanceau, que chocou os generais durante a Primeira Guerra Mundial ao dizer que “a guerra é séria demais para ficar apenas nas mãos dos militares”.
A inédita democratização do debate econômico tem a ver com a profissão dos principais players desta história: Marx foi jornalista e dono de jornais na velha Prússia; perseguido e silenciado, acabou como articulista do maior jornal americano na segunda metade do século 19, o New York Daily Tribune. Durante onze anos escreveu 350 artigos, alguns em parceria com Friederich Engels, e assim sobreviveu com relativo conforto.
Piketty é colunista mensal do Libération e ocasionalmente colabora com o Le Monde. E seu principal suporte é Paul Krugman, Nobel de economia e articulista regular do New York Times.
Comprovado: a distribuição da riqueza é também tarefa da imprensa livre.
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