A posse do novo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, noticiada na quinta-feira (2/1), cria a oportunidade para um rápido balanço do poder da República que capitalizou as atenções da imprensa no ano que passou. Principalmente por conta do julgamento da Ação Penal 470, e com a série de denúncias que vieram a público durante a gestão da ministra Eliana Calmon na Corregedoria Geral da Justiça, entre 2010 e 2012, e que geraram um volume inédito de processos contra magistrados, o Judiciário passou boa parte do ano de 2013 sob forte escrutínio público.
A polêmica atuação do ministro Joaquim Barbosa na presidência do Supremo Tribunal Federal foi transformada em plataforma sobre a qual a imprensa o apresentou como símbolo de novos tempos nos tribunais brasileiros. As iniciativas e, principalmente, as declarações bombásticas da ministra Eliana Calmon, sobre crimes cometidos nos bastidores da magistratura, colocaram na rua a roupa suja que o corporativismo tenta ocultar.
Neste início de ano, os jornais trazem a questão para o foco da realidade, e o leitor começa a entender que nem tudo é o que parece por trás das manchetes.
A ministra Eliana Calmon, que ganhou as primeiras páginas com a expressão “bandidos de toga”, anunciou em dezembro sua filiação ao Partido Socialista Brasileiro, devendo se lançar candidata ao Senado pelo estado da Bahia. O ministro Joaquim Barbosa mantém em segredo suas eventuais ambições políticas, resistindo ao chamamento da imprensa para se candidatar a presidente da República. Na quarta-feira (1/1), o assunto voltou ao noticiário, por conta de sua visita a um evento de sambistas no Rio de Janeiro, e por causa de uma declaração do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a um programa de televisão, quando o considerou inapto para a chefia do governo.
Para o ex-presidente FHC, é natural que, como resultado do descrédito nas instituições, muita gente saia à procura de um “herói salvador”. Mas, na sua opinião, esse herói não é Joaquim Barbosa. Para ele, uma possível candidatura de Barbosa à presidência da República seria apenas uma aventura.
Egos inflados
Ainda na quarta-feira, dia 1º, a Folha de S. Paulo havia noticiado que a Justiça estadual, em todo o Brasil, teve um desempenho pífio no combate à corrupção. As cortes estaduais julgaram em 2013 apenas 40% de todas as ações por improbidade administrativa e 52% dos processos criminais contra o Estado, contrariando as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça.
Na Justiça Federal, os tribunais regionais mostraram mais serviço, julgando 56% dos casos de improbidade administrativa e 77% dos crimes de corrupção, o que deixa a média geral abaixo da expectativa oficial. Ou seja, a Ação Penal 470 foi uma exceção.
No artigo que publica na edição de quinta-feira (2/1) do Estado de S. Paulo, o novo presidente do Tribunal de Justiça paulista, José Renato Nalini, observa que “o judiciário é o grande protagonista da cena estatal neste início do século 21”. Mas ele não considera que a instituição poderá dar uma resposta satisfatória à sociedade brasileira, se a própria sociedade insistir em tentar resolver todas as pendências nas barras do tribunal. O magistrado entende que o estado de beligerância exige que o sistema da Justiça cresça exponencialmente, o que produz uma equação impossível.
Essa é uma questão que afeta diretamente a imprensa, e é nesse ponto, o da interlocução do sistema de comunicação social com a sociedade e as instituições, que acontece o grande nó. Há uma tendência crescente de espetacularização da notícia, observada por dez entre dez pesquisadores da imprensa: em busca de uma audiência cada vez mais pulverizada pela expansão das mídias digitais e a queda do interesse pela leitura de textos longos e elaborados, o jornalismo cai na armadilha do “manchetismo” e do “declaracionismo”, criando espaços onde o bate-boca substitui o diálogo.
As redações demitem repórteres e se enchem de articulistas, que, na luta por destaque, transformam o jornalismo num ruidoso desfile de egos inflados em disputa de opiniões contundentes. A radicalização das opiniões estimula conflitos e empurra as reflexões para fora do sistema da mídia tradicional.
Esperar que a Justiça funcione numa sociedade beligerante é uma ilusão.