Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Obama, a ciência e a Amazônia

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, foi enfático: educação e ciência para que se chegue a qualquer lugar no futuro. O anúncio se deu em discurso – acompanhado em todo mundo – proferido anualmente ao povo e ao Congresso, em 26/01. Nenhuma grande descoberta nesta fala; mas vindo de onde veio faz-nos ter algumas reflexões. Primeiro, porque os americanos sempre estiveram à frente neste quesito. Logo, por que a preocupação agora? Segundo – já respondendo à primeira questão –, fica aos países mais atrasados (Brasil) uma pulga atrás da orelha: se mesmo os EUA estão coçando a cabeça com isso, imaginem nós, que investimos muito menos que eles neste campo?

Ora, os EUA não têm a Amazônia – apesar de gerenciarem o Alasca, área remota, mas de grande valor ambiental e econômico (e desejarem ter um pedacinho deste paraíso tropical). Ou seja, embora sejam um país grande e vasto, os americanos possuem menos recursos naturais para a inovação tecnológica – como quer e anuncia Obama.

Mas, seguindo a lógica do presidente, se possuem o saber (leia-se ciência e tecnologia [C & T]; leia-se gente [bem] formada), o recurso natural seria um mero detalhe: há várias formas de acessá-lo. Verdade?

Fator de melhoria do padrão de vida

Uma coisa é certa. Os grandes países desenvolvidos têm em comum arma poderosa da qual os outros apenas sabem da importância: ciência e tecnologia. A China e a Coreia do Sul, novos convidados à mesa dos grandes, têm-se mostrado competentes neste quesito (formam mais doutores e engenheiros que o Brasil). Uma das grandes diferenças, por exemplo, é que entendem ser importante enviar seus jovens para aprender onde, em tese, se sabe mais: Estados Unidos e Europa. Não têm vergonha de assumir.

Já aqui, os tupiniquins acham que basta formarmos nossas mentes apenas em casa, significando que contato, vivência e aprendizado (de verdade) de outras línguas não interessa. Um erro que – apesar do Brasil ter melhorado em número de artigos publicados – ainda nos deixa aquém em critérios de inovação tecnológica. Para piorar, os doutores formados no Brasil não querem conhecer (e muitos nem conhecem) a Amazônia. A atração destes cérebros é difícil para a região. A maravilha das grandes metrópoles – com certa razão, se comparado salários e condições de trabalhos – é mais atrativa. Impera, ainda, a falácia da grande ‘hiléia’ misteriosa, vestida de terceiro mundo, não merecedora de olhar dos intelectuais do grande centro.

Apesar da fama, a importância da região para ciência teve ainda maior peso com a visita do novo ministro da Ciência e Tecnologia a Manaus no mesmo dia em que Obama fez seu discurso. Economista de boa formação, Aloizio Mercadante tem em boa conta a Amazônia. Mas terá que dar muitas braçadas para mudar o quadro de investimentos no setor – sobretudo para as florestas tropicais.

Vejamos um bom exemplo. A ciência de transformação, ou ciência aplicada, citada pelos americanos – saído da boca do seu maior chefe – é o principal fator de melhoria do padrão de vida de qualquer país. Temos a Amazônia, mas pouco sabemos como usá-la mais inteligentemente (como pontuais exceções). Mercadante conhece o gargalo na Amazônia, mas o que fará de diferente do seu antecessor e afilhado político, o governador pernambucano? Talvez muito pouco.

O ciclo se repete

De qualquer maneira, uma olhada na matriz da exportação brasileira prova fácil o quanto C & T são fundamentais para o desenvolvimento. A menor parte do que vendemos é oriunda de pesquisa e tecnologia: oferecemos produtos básicos ou, no máximo, semi-acabados (madeira, grãos, minério bruto e carne – basicamente, extraídos da natureza). Resultado: lucra-se menos e, como a se olhar para o retrovisor da história, nos vemos como o velho país de 100 anos atrás: agroexportador e dependendo do humor de quem compra.

As iniciativas de uso diferenciado param em burocracias, em falta de recursos ou mesmo em pouca gente para tocar as ideias (não ouvimos uma notícia sobre o que, afinal, descobriu ou gerou de produto o Centro de Biotecnologia da Amazônia – CBA em Manaus, por exemplo). Mera crítica? Não. A ideia do CBA é uma das melhores surgidas nos últimos 20 anos na região, mas pouco se avançou.

Assim, Obama e sua lógica de futuro não são novidades – embora a retórica do advogado-presidente seja diferente, se comparada à dos antecessores no cargo. Igualmente, a Amazônia, melhor pensada, melhor explorada e melhor tratada é uma ideia tampouco nova: fala-se nisso pelo menos há um século. O que há de novo? Na verdade, nada.

O que se vê é que o ciclo se repete. Os anos se somam no calendário e pouco se avança. Consequência: outro texto como este não demorará. Também com as mesmas cores. Tomara que com melhores notícias.

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Engenheiro agrônomo e mestre em Ciências Florestas Tropicais, Manaus, AM