Os dois grandes jornais de São Paulo, Folha e Estadão, deram na quarta-feira (27/8) grande destaque à decisão que deverá ser tomada pelo Supremo Tribunal Federal a respeito da criação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. O Globo, do Rio, preferiu apostar em outro conflito latente, aquele que amadurece nas favelas cariocas e coloca em confronto traficantes e policiais corruptos, que formam milícias para vender serviços clandestinos aos moradores.
Nos dois casos, o que se lê é a história de um Brasil que avança pela primeira década do século 21 carregando mazelas de sua fundação: no litoral, onde se concentrou a modernidade, ou no interior da Amazônia, milhões de brasileiros ainda vivem à margem da sociedade, sob o risco de tiranias de vários tipos e sem a proteção do Estado.
Os indígenas ainda conseguem fazer ouvir sua voz, e, segundo dizem os jornais, se mostram dispostos a resistir. Já os excluídos urbanos se submetem passivamente a seus dominadores, que agora definem em quem eles devem votar.
O conflito entre índios e plantadores de arroz chegou ao ponto em que qualquer decisão do STF pode provocar a eclosão da violência, e a situação agora parece sensibilizar a imprensa.
Depois de oferecer amplo espaço aos fazendeiros que se estabeleceram na área, justificando diante da sociedade urbana um processo de invasões planejado para impor o fato consumado, os jornais apostam numa decisão que não atenda completamente a nenhuma das duas partes.
População contaminada
É bem possível que, como anuncia a imprensa, a Suprema Corte escolha não consolidar toda a área destinada pelo governo à reserva, preservando em parte os interesses dos arrozeiros. Mas faltam informações na imprensa sobre a capacidade dos índios de resistir à continuidade da expansão das lavouras, porque já se demonstrou que os agricultores não aceitam limites.
Por outro lado, faltam informações também para convencer a sociedade de que a criação de reservas extensas para os povos tradicionais que já têm muito contato com os brancos é medida suficiente para protegê-los.
Uma notícia publicada hoje pelo Estado de S.Paulo informa que 87% dos índios que vivem no Vale do Rio Javari, no Amazonas, estão contaminados com o vírus da hepatite. Esse é um dado que pode ajudar o leitor a pensar no que acontece quando o Estado falha em proteger suas populações nativas.
Leia também
A guerra do arroz – Luciano Martins Costa