Há poucos minutos foi encerrado o primeiro debate televisivo para as eleições presidenciais 2010. Noves fora nada, considero que assistimos a um debate anódino, previsível, sem estrelas nem meteoros, debate em que prevaleceu uma fala repetitiva do que vinha sendo noticiado nos meios de comunicação desde janeiro último.
As regras da Band foram acertadas, claras e apresentadas didaticamente e sem grandes firulas. Longe de transcorrer de forma monótona, arrastada e a demandar esforço hercúleo do mediador Ricardo Boechat, o debate serviu para apresentar algumas coisas que, por simples, poderiam ser vistas como secundárias em importância para o atual processo eleitoral que engolfa o Brasil em todos seus quadrantes.
Vinte e quatro vezes observou-se interação imediata e inédita, ágil e concisa, entre José Serra e Dilma Rousseff. Fizeram perguntas mútuas, réplicas mútuas, tréplicas mútuas. Ignoraram partes das perguntas de forma ostensiva e algo solene. Responderam o que bem queriam responder. Melhor: respondiam ao que não lhes fora perguntado. Mas foi bom ouvir essas vozes sem filtro de editores de jornais e revistas, sem mesas de edição de nossos telejornais. Nem o paulista é o Schumacher da experiência consumada em debates nem a mineira é iluminada e ganha vida ante puxões de cordéis.
Corpo inteiro
Marina Silva equilibrou-se com graça e leveza e não precisou responder a questões sobre casamento homossexual e muito menos elaborar em dois minutos algo sobre legalização do aborto. Esperava mais, dado o elevado teor de humanismo que irradia por onde passa. Sua fala final foi de longe a melhor, a mais instigante e mesmo inesperada. Trouxe um imenso dado a mais para reflexão de todos quantos assistiram ao debate. Um garoto Dado em suas veste humanas, com rosto humano, voz de criança que pousa os olhos sobre o futuro. Trouxe, ainda assim, algo novo em termos de pensamento: temos que superar ‘a lógica do eu-eu, posso-posso, tenho-tenho’.
Grata surpresa o bom humor, a perspicácia e a inteligência de todas as falas de Plínio de Arruda Sampaio. Havia momentos que bem recordava o grande Campos de Carvalho, aquele autor indispensável que assina momentos únicos das letras brasileiras como os romances A vaca de nariz sutil e A lua vem da Ásia. Foi um consumado Papanatas (só quem leu Carvalho sabe que isso significa!). Plínio se revelou de corpo inteiro, provocou, instigou, aproximou-se dos limites do non sense, retrocedeu, acusou um e todos, retraiu-se e concedeu atestado de debate light ao pioneiríssimo debate promovido na Band.
Música no ar
Quem esperava interações explosivas de nossos velhos debatedores de quase sempre, como Jânio Quadros e Franco Montoro, Leonel Brizola e Paulo Maluf, Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor… tomou o trem bala errado. Fez falta ouvir uma vez mais que o pai de José Serra carregou caixas de hortaliças na cabeça para que o filho ilustre carregasse caixas de livros. Dilma Rousseff, demorou mais de uma hora para trazer ao debate o nome do presidente Lula, seu grande inspirador político. Faltou ao menos um ‘uai, sô’ nas locuções de Dilma.
Obviamente será um evento a ficar na história destas eleições mais pelo que será repercutido que pelo evento em si. Repercussão que desnudará por inteiro o que a mídia teima em esconder – sua irreversível opção pela partidarização da presente corrida presidencial.
O melhor momento foi, certamente, a apresentação da Orquestra Filarmônica Bachiana do Sesi, sob o comando do talentoso João Carlos Martins.
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Mestre em Comunicação pela UnB e escritor; criou o blog Cidadão do Mundo; seu twitter