Sigmund Freud já se foi há mais de 70 anos, mas, na condição de ‘pai da psicanálise’, continua sendo invocado feito um santo padroeiro para explicar aqueles meandros da mente humana que escapam aos princípios da lógica. Um desses desafios é entender a fixação – ou obsessão ou mania – que o jornalista José de Souza Castro tem com o jornal Estado de Minas e com o governador tucano Aécio Neves. Ambos são temas recorrentes nos artigos que Castro escreve e publica em sites diversos na internet. Seria mais facilmente compreensível a insistência se ambos, jornal e governador, fossem objeto de estudo sistemático, mas não parece ser o caso.
Em seu artigo mais recente, intitulado ‘Aécio de barbas de molho’ e disponível no portal da NovaE (ver aqui), Castro se dedica a listar declarações elogiosas de Aécio ao governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM). Novidade não há, já que as declarações foram públicas e estão disponíveis, como aponta o próprio jornalista, na agencia de notícias do governo de Minas. Mas, como se sabe, Arruda anda pela bola sete com o vendaval de denúncias de corrupção que irromperam a partir da mais recente operação da Policia Federal. E a intenção de Castro, obviamente, é transformar os elogios de Aécio à administração de Arruda em uma aprovação tácita a tudo que o demista andou aprontando com panetones e caixas de campanha.
Essa alquimia com declarações de Aécio é, com o perdão da expressão ligeiramente rude, de uma desonestidade intelectual ímpar. É fato que José de Castro não foi o único a fazê-la, mas isso não torna o ato mais razoável. O que fica evidente é que Castro arranjou um jeito de tirar mais uma casquinha de Aécio. Se o objetivo fosse uma análise política de eventuais ligações perigosas com Arruda, Castro, experiente que é, haveria de citar também as diversas declarações elogiosas do próprio Luiz Inácio Lula da Silva ao governador do Distrito Federal.
Uma pesquisa, no mínimo mal feita
Não há, porém, uma linha sobre as falas do presidente em discurso na inauguração de linhas de metrô (ver aqui). Aécio fala em ‘sinergias’ entre as duas administrações e Lula exalta a ‘parceria’ que mantinha com Arruda, apesar de serem de partidos antagônicos. E daí?
Não é nem um pouco razoável supor que Aécio e Lula estivessem, em suas respectivas declarações, concedendo um aval aos largos desvios de conduta de José Roberto Arruda. Os elogios ecoavam, isto sim, as evidentes melhorias promovidas na administração do Distrito Federal e reconhecidas pela própria população: nas pesquisas de avaliação de governos do DataFolha, Arruda aparecia com 38% de aprovação ao fim de seu primeiro ano de mandato, em 17 de dezembro de 2007, atingindo uma avaliação positiva de 58% na pesquisa divulgada em 25 de março deste ano. Ou seja, fica evidente que seu governo vinha em ascensão e que a maioria da população de Brasília e das cidades satélites também haveria de dar declarações elogiosas sobre seu governador e, claro, não estaria corroborando os episódios de corrupção.
José de Castro, aliás, não só desconhece as declarações de Lula, como as do próprio Aécio. Insinuando um silêncio constrangido do governador mineiro, o jornalista escreve que procurou no Google e não encontrou nenhuma declaração dele a respeito do caso. Quanta bobagem! O artigo de Castro foi publicado no dia 2 de dezembro, mas não é possível saber quando ele o redigiu. Talvez tenha sido no calor dos fatos (ou das suas idéias), já que no dia 30 de novembro há nota distribuída à imprensa com declarações de Aécio exigindo ‘o esclarecimento do caso o mais rápido possível’. Elas foram publicadas pelo Estadão em sua versão online e replicadas em outros sites e portais (ver aqui). E, no dia 2, Aécio falou sobre a repercussão das denúncias para as eleições de 2010 (ver aqui). Ou seja, Castro constrói seu argumento sobre uma pesquisa, no mínimo muito malfeita, e poderia emendar seu artigo com informações fresquinhas se assim o quisesse.
Mesmo tratamento dado a outros políticos
Toda essa elucubração do jornalista, no entanto, serve, precariamente, de fio condutor para que ele dê tratos à sua outra fixação. Das declarações e do suposto silêncio de Aécio, ele passa a discorrer sobre o tratamento dado pelo Correio Braziliense ao caso e deságua em outro veículo do mesmo grupo editorial, o… Estado de Minas! E o faz de forma estarrecedora. Escreve José de Castro: ‘Não tenho muito interesse de ler o Estado de Minas e não sei o que vem publicando a respeito. Mas suponho que os mineiros que quiserem se informar bem sobre o caso devem ler outro jornal.’ Uai! Se não há interesse, por que esse veículo em particular é tema recorrente nos ataques do jornalista José de Castro? Por que essa obsessão com o jornal Estado de Minas, que ele chega a confundir com a imprensa em sua totalidade no estado de Minas Gerais? Porque, na verdade, para José de Castro parece que em Minas só existe o Estado de Minas.
Então, vamos lá, já que não tem interesse pelo Estado de Minas, Castro deveria seguir seu próprio conselho e ler outros jornais. Alguém deveria avisá-lo que em Minas há um jornal chamado O Tempo, que tem escrito inúmeros textos contra o governo e o governador, tanto em reportagens quanto em editoriais; que há também o Hoje em Dia, que, entre outros assuntos, desfia críticas sistemáticas contra a política de segurança.
Talvez essas leituras poderiam oferecer um novo ponto de vista sobre a imprensa mineira e livrar o jornalista de sua fixação em criticar um jornal que não lê e pelo qual não se interessa. Com um horizonte mais amplo, ele poderá perceber que o tratamento dispensado a Aécio Neves pelo Estado de Minas é idêntico ao que receberam políticos de outros campos, como os ex-prefeitos Fernando Pimentel e Patrus Ananias, ambos petistas no período em que ocuparam a prefeitura da capital. Mas aí o jornalista vai perder o discurso. E cair na realidade, que é tão chata.
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Publicitário, graduando em Jornalismo e em Direito, Belo Horizonte, MG