Já se disse neste Observatório, mais de uma vez, que a visão fragmentada da crise econômica apresentada pelos jornais dificulta a compreensão do estado do mundo.
Nesta terça-feira, dia 22, a queda abrupta da Bolsa de Madri, que revela o recrudescimento das dificuldades na Espanha logo após e “a despeito” da vitória dos conservadores nas eleições, apanhou de surpresa a imprensa em geral.
Aparentemente, a imprensa acreditava que bastaria a perspectiva de um governo à direita dos socialistas para acalmar o mercado. Um governo conservador, em tese, significa menos investimento do estado na proteção social e mais liberdade de movimento para o capital.
Mas o que se viu foi o temor generalizado de calote, com os investidores exigindo o aumento de juros na remuneração dos títulos públicos.
Uma das características das crises prolongadas, como a atual, que eclodiu há três anos e não dá sinais de melhoria, é a perda da noção de longo prazo e a luta pela sobrevivência.
Ao refletir apenas a algaravia dos desesperados, a imprensa contribui para a sensação de caos que toma conta do mercado.
Mesmo no Brasil, onde se vive um clima de relativa calma, a natureza global das turbulências afeta decisões importantes e coloca em risco alguns setores que vinham apresentando boas perspectivas.
A súbita alta do dólar é apenas uma das consequências e os ajustes que a Bolsa brasileira é obrigada a fazer já levam alguns analistas a prever que o setor de corretagem de títulos e ações vai encolher pelo menos 30%.
Em meio ao noticiário sobre o caos, a Folha de S.Paulo oferece aos leitores um lampejo de lucidez, na entrevista do economista James Galbraith, professor da Universidade do Texas em Austin e filho do célebre economista e escritor John Keneth Galbraith, autor de A era da incerteza.
Sem meias palavras, James Galbraith afirma que a Europa precisa de um “New Deal” – o plano de grandes obras e intervenção estatal que tirou os Estados Unidos da crise de 1929.
Ele observa também que, na verdade, os europeus tomaram o caminho contrário e se tornaram reféns dos principais responsáveis pela crise: o novo presidente do Banco Central Europeu e os principais condutores da economia nos países da região, como Mario Draghi, Lucas Papademos e Mario Monti, são ligados a bancos como o Goldman Sachs, que detonaram a crise de 2008.
O caminho que ele aponta é parecido com o que foi tomado pelo Brasil: consolidar as dívidas e estimular o crescimento.
Mas tudo indica que a conta vai ser entregue à sociedade, através do desemprego e do corte de benefícios sociais.
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Observatório da Imprensa na TV*
No Observatório da Imprensa desta terça-feira, 22, Alberto Dines comanda programa especial que vai relembrar os 60 anos que marcam o surgimento do jornal Última Hora.
Colaboradores do diário irão contar sobre o papel do jornalista Samuel Wainer e da importância do próprio jornal, peça política e emblema democrático de tempos anteriores à ditadura militar. Com sede no Rio de Janeiro, quando a cidade, ainda capital federal, era palco dos principais fatos políticos do país, o Última Hora mudou a imagem do jornal popular e inovou em diagramação e na valorização dos jornalistas, ganhando projeção na imprensa carioca e nacional, sem abster-se da opinião e da crítica.
Destacam-se na trajetória de Wainer as campanhas nacionalistas que liderou através de seu jornal, suas relações com o poder e os debates públicos com Carlos Lacerda, político que fazia ataques sistemáticos a Wainer por causa de sua relação com o presidente Getúlio Vargas.
Para debater a vocação democrática e o jornalismo do Última Hora, e contar mais da trajetória de Samuel Wainer, estarão no estúdio com Alberto Dines a historiadora Alzira Abreu (FGV) e o jornalista Milton Coelho da Graça.
O programa também leva ao ar depoimentos gravados de Pinky Wainer, filha de Samuel Wainer; Maurício Azêdo, presidente da ABI; Pery Cotta, professor universitário; Benício Medeiros, repórter e autor do livro A Rotativa Parou, narrativa sobre os últimos dias do Última Hora; e a jornalista Joëlle Rouchou, pesquisadora da Fundação Casa de Rui Barbosa e autora de Duas Vozes de Samuel Wainer. Participam ainda os jornalistas Domingos Meirelles, Pinheiro Júnior e Marta Góes, o cartunista Lan e o repórter fotográfico Alcyr Cavalcanti.
O Observatório da Imprensa vai ao ar nesta terça-feira às 22 horas, pela TVBrasil, ao vivo em rede nacional. Em São Paulo pelo canal 4 da NET e 116 da Sky.
*Com Lucas Rodrigues de Campos