‘O fim de semana violento em São Paulo pegou os plantões do telejornalismo de surpresa para mostrar, mais uma vez, que notícia não tem hora, e que todo dia é dia útil. As emissoras se armaram para reagir na segunda-feira usando imagens da sexta à noite, do sábado e do domingo, e contribuíram para instalar o pânico justamente quando a notícia tinha ido embora. Internautas neuróticos, em seus orkuts ou fora dele, alimentaram a boataria que imperou na segunda-feira de poucos fatos e muita tensão.
O jornalismo da Cultura arrombou a grade de programação e dominou todos os espaços que conseguiu: duplicou o Boletim Cultura (de meia em meia hora), antecipou o Jornal da Cultura para as 19h30m, substituiu um Roda Viva gravado pelo debate sobre as causas da violência e suas conseqüências e ainda voltou com o JC à meia-noite. Pela primeira vez em muitos meses o jornalismo da nossa TV pública mostrou agilidade e senso de oportunidade, mas não foi só isso: conseguiu encontrar o tom certo.
A cobertura da TV Cultura foi mais equilibrada que a das outras emissoras. As ‘comerciais’ não resistiram aos apelos ao sensacionalismo, jogando no ar matérias de quatro dias como se fossem atuais, criando assim um pacote-pânico que assustou a população e fez todo mundo ir para casa mais cedo. Com exceção da Cultura, as emissoras se renderam ao espetáculo, carregaram nas tintas e editorializaram o noticiário, transformando o jornalismo em um show de horrores.
A Cultura soube aproveitar esse momento especial para firmar o seu diferencial de TV pública. Veiculou todas as informações relevantes e recorreu a opiniões abalizadas para sustentar o noticiário. Nessa linha, exibiu recursos próprios que as outras emissoras não têm. Por exemplo, os comentários de Renato Lombardi, um profissional que conhece o mundo do crime e o aparato de segurança como ninguém. Para ficar no ponto certo, bastaria que Lombardi falasse de forma mais pausada, mas isso não chegou a comprometer o seu trabalho – apenas, poderia ter sido melhor.
A sobriedade de Heródoto Barbeiro cai bem em ocasiões assim. Ao seu lado na bancada, uma Valéria Grilo repaginada completou a ancoragem passando credibilidade, fundamental para o clima de sensatez almejado – e alcançado. A melhor síntese do bom jornalismo praticado pela Cultura ficou por conta da entrevista com Denis Mizne, do Instituto Sou da Paz. Ele conclamou a população a ‘não abrir mão do espaço público’, condenando o ‘bater em retirada’ sugerido pelo pânico instalado na cidade. Sem qualquer concessão ao chapabranquismo, a Cultura prestou um serviço público de qualidade, com ponderação e senso de responsabilidade.
Quem agiu mal foram as autoridades convidadas para o Roda Viva, recusando-se a comparecer. No Brasil, os homens públicos parecem ignorar a importância da comunicação, em situações como essa, e a inclusão dela entre seus deveres mais elementares.’