Sexta-feira (6/2), hora do almoço: a forte resistência (tanto no Brasil como no exterior) à indicação de Aldemir Bendine para presidir a Petrobras levou alguns analistas a apostar na hipótese de que o Palácio do Planalto não poderia ter incorrido em tamanho erro.
Seria o truque do velho balão de ensaio: o atual presidente do Banco do Brasil seria, na verdade, o boi de piranha para saciar os mais indignados. Devidamente esfolado por críticos, o nome de Bendine seria então retirado em favor de outro candidato sempre citado na lista dos favoritos, também oriundo do setor público, também banqueiro e com uma folha-corrida sem qualquer interrogação: o economista Luciano Coutinho, presidente do BNDES.
No meio da tarde, precisamente às 15h22, a confirmação: o Batman salvador da Petrobras será o banqueiro do povo, o presidente do BB, Aldemir Bendine. O governo não admitia que a festa do 35º aniversário de fundação do PT fosse empanada por uma nova capitulação ao satânico mercado. A presença de Joaquim Levy no comando da economia já é um sapo suficientemente avantajado para ser engolido por um governo comprometido com programas assistenciais, antiprivatista e antimonetarista. E o anúncio foi feito durante o pregão numa clara demonstração de menosprezo pelo código bursátil.
Proposta imprudente
O PT vive o momento mais complicado da sua história, maior do que o dilema que precedeu a sua fundação: rachar a diversificada frente de oposição ao regime militar representada pelo PMDB e impregnada pelo mofo do peleguismo ou criar um partido dos trabalhadores novinho em folha, vigoroso, ético, moderno, respeitado até pelo patronato.
A escolha de Bendine não deixa de ser um ato de bravura. Depois de tanta perplexidade e vacilações, encostado nas cordas pelo incrível tsunami de denúncias de corrupção e incompetência na maior estatal da América Latina, só restou ao governo do PT encarar a adversidade. Sua bala de prata não poderia ser outra senão um mínimo de coerência – apegar-se aos seus valores e à sua mitologia. Sequer filiado ao partido, o quase desconhecido Aldemar Bendine tem um peso simbólico nada desprezível apesar dos embaraços recentes.
Em 2005, igualmente sitiado pelas revelações do mensalão, o presidente Lula refugou a ideia da refundação que considerava derrotista preferindo a tática malandra do “todos fazem e nós também” (caixa dois). Certo ou errado, pelo menos não colocou o cangote na guilhotina.
Uma década depois, com o flanco parlamentar visivelmente vulnerável graças à eleição de um desafeto cordial para presidir a Câmara e um ministério de nulidades que só produzirá aborrecimentos, a situação é mais dramática.
Sobretudo porque a oposição assanhada pela infiltração direitista agora joga mais pesado do que antes. Não foi prudente – sequer jornalisticamente justificada – a publicação pela Folha de S. Paulo, na terça-feira (3/2), do parecer do emérito jurista Ives Gandra Martins, reconhecidamente conservador e próximo aos velhos círculos militares, admitindo a legitimidade do impeachment presidencial.
Reforma política
O impeachment é um recurso constitucional, já havia sido lembrado quando a opinião pública levantou-se contra os desmandos do então presidente Fernando Collor de Mello, que preferiu renunciar. Nas atuais circunstâncias e desfraldado pela imprensa pode ser visto como provocação, desnecessária exacerbação dos setores petistas que esgoelam-se tentando provar o “golpismo” da mídia. Tipo de confronto que agora só agrava a tensão.
A sucessão de revelações sobre o descalabro na Petrobras tem vastas e profundas implicações econômicas, políticas e sociais. Não se trata de um escândalo de proporções inauditas, mas de algo maior e mais grave: estamos na iminência de uma catástrofe. E catástrofes evitam-se isolando suas causas, enfrentando cada uma com os recursos apropriados.
A nova diretoria da Petrobras é claramente interina – antes assim. O início das discussões sobre uma drástica reforma política permitirá que a diretoria definitiva possa agir num ambiente saneado, livre das armadilhas cujo desfecho é conhecido. Hora de dirigir com extremo cuidado. Nos dois sentidos.