Elif Shafak, uma das escritoras mais conhecidas da Turquia, irá a julgamento em 21/9 por causa de seu novo romance, noticia Suzan Fraser [Associated Press, 9/9/06]. Elif, que está prestes a ter um filho, foi acusada de “insultar a identidade turca” por ter colocado um personagem em seu livro comentando o massacre de armênios durante os últimos anos do Império Otomano. “Eu acho que o meu caso é muito peculiar porque, pela primeira vez, eles estão condenando personagens fictícios”, comenta a autora.
A Turquia insiste que a morte de mais de 1,5 milhão de armênios durante as evacuações forçadas durante a Primeira Guerra Mundial, entre 1915 e 1923, não constitui genocídio. O assunto ainda é tabu no país.
A escritora divide seu tempo entre Tucson, nos EUA, onde é professora na Universidade do Arizona, e Istambul. Elif tentou adiar a data de seu julgamento para depois de ter seu primeiro filho, mas o pedido foi recusado. Se condenada, ela pode pegar três anos de prisão.
Para a autora, a lei sobre insultar o nacionalismo turco “vem sendo usada como arma para silenciar muitas pessoas”. Orhan Pamuk, um dos escritores mais conhecidos da Turquia, e outros romancistas e intelectuais também tiveram de enfrentar as mesmas acusações de insulto à nação. No entanto, até hoje, nenhum deles foi condenado à prisão.
UE vs. nacionalismo
O caso confirma a onda crescente do nacionalismo turco e levanta dúvidas sobre se a Turquia, país-membro da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), deve ser admitida para a liberal e democrática União Européia – o que é apoiado pelo governo Bush. Turcos que anseiam que o país torne-se membro do bloco europeu temem que os julgamentos de escritores possam prejudicar a admissão da Turquia.
Já nacionalistas como Kemal Kerincsiz, um dos advogados responsáveis pelas acusações a Elif, argumentam que a Turquia não deve abandonar convicções tradicionais – entre elas, a de que nunca houve um genocídio armênio – somente para agradar a Europa. “O Oriente é obrigado a se insultar e degradar sua própria cultura para se integrar ao Ocidente”, acusa Kerincsiz. “Nosso lugar é na cultura oriental”.
Elif acredita que o crescente nacionalismo é uma reação ao fato de a Turquia estar se tornando mais democrática e pluralista na medida em que tenta se juntar à UE. “Este movimento ultranacionalista está ocorrendo não porque nada está mudando na Turquia, mas sim o contrário: porque o país está passando por um momento de transformação”, diz a escritora. “Quanto maior a transformação, maior o pânico”.
O livro de Elif teve 60 mil cópias vendidas, o que representa um sucesso de vendas na Turquia, e deve ser lançado em língua inglesa em 2007.