Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Política e estilo

Podemos conhecer melhor ou prever o estilo de governar dos candidatos à eleição presidencial se analisarmos as peculiaridades de seu diálogo com o público, sua conduta verbal, sua postura física perante as câmeras etc.

Salta aos olhos, por exemplo, a desenvoltura de Lula. Seus anacolutos e solecismos não o inibem. E nós, por outro lado, já nos habituamos aos seus escorregões gramaticais, tanto quanto à voz rouca e encorpada. Mesmo a aderência da língua à abóbada palatina, a anciloglossia de que também padecem o ministro Palocci e o deputado Vicentinho, tem certo charme. O ceceio característico quase se torna sinal de status. Os que ainda forem eleitores do PT dirão: ‘É melhor língua presa do que rabo preso…’

Lula não é refinado e se há alguém menos parecido com personagem proustiano, eis o nosso presidente. Contudo, eis também as antigas fotos do metalúrgico em contraste com as do atual chefe da nação. Nada mais natural. O fato, porém, é que ternos elegantes, barba aparada e cabelo bem cortado jamais eliminarão o modo um tanto áspero de dirigir-se a nós.

Planalto prometido

O estilo do governador Alckmin é bem outro. Fala com a afetação de quem precisa provar a cada minuto que possui todas as virtudes: honestidade, equilíbrio, prudência, autoridade, austeridade, perseverança, religiosidade, experiência, despojamento… Até os movimentos para tomar um copo d’água são calculados. Comportamento impecável, respostas firmes e serenas. Muita ascese por trás das palavras e gestos.

O maldoso (e acertado) apelido – sorvete de chuchu – reflete-se na sem-gracice do candidato, o discurso frio e insosso. Contar piadas também é uma virtude, mas essa ele não possui.

A senadora Heloísa Helena carrega, como quem está sempre defendendo os filhos, a bandeira da indignação. Ternura há, mas a fúria é marca registrada. A voz em delírio. A voz estridente. A capacidade de brigar durante horas seguidas com a vizinha que jogou lixo na escada ou com todas as multinacionais do planeta.

A calça jeans e a camisa branca simbolizam a disposição de pôr a mão na massa. Não há tempo para maquiagem ou enfeites. Prende-se o cabelo e vamos à luta. O sotaque alagoano empresta tons proféticos de uma rebelião nordestina à la Antônio Conselheiro. Pregando no deserto, amaldiçoando os traidores da humanidade, terá vinte anos pela frente até alcançar o planalto prometido.

Estilo, como define Adélia Prado, é limitação.

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Doutor em Educação pela USP e escritor (www.perisse.com.br)