Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Por trás das motivações políticas

No dia 17/3, uma advogada Republicana, citando uma fonte confidencial de uma repórter do New York Times, testemunhou no Congresso, acusando o jornal de não ter publicado uma matéria há alguns meses porque ela poderia influenciar a campanha presidencial americana. A acusação, divulgada por Bill O’Reilly no canal conservador Fox News em abril e em blogs de direita, pode ser, se comprovada, bastante ‘prejudicial a uma organização de mídia’, escreveu o ombudsman do NYTimes, Clark Hoyt, em sua coluna de domingo [17/5/09].

Se for verdade, isto significa que editores do diário, cujo trabalho é reportar os fatos sem medo ou favoritismo, não tiveram integridade para publicar uma matéria que poderia prejudicar a campanha do Democrata Barack Obama. Hoyt investigou a questão por semanas – entrevistando e enviando e-mails para todos os envolvidos, lendo transcrições, avaliando registros financeiros de campanhas e checando informações com especialistas legais. A conclusão, segundo ele, é que a acusação não tem sentido.

Acorn

A matéria em questão envolve acusações de que a campanha de Barack Obama – junto com o grupo ativista comunitário de esquerda Acorn, que prestou serviço a ele e que conseguiu uma enorme inscrição de eleitores no ano passado – era culpada de violações técnicas da lei de financiamento de campanhas políticas. Evidências fornecidas pela fonte não puderam ser comprovadas. Mesmo se a matéria tivesse sido divulgada, é difícil acreditar que um editor a teria visto como suficiente para mudar os rumos das eleições, com os Republicanos sofrendo com uma guerra nada popular e com a economia em crise.

A polêmica, entretanto, oferece um olhar sobre um aspecto do jornalismo que o público raramente vê: a delicada relação entre um repórter e a fonte que traz as informações com diferentes motivações e padrões. E mostra, ainda, como partidários podem fazer com que um processo editorial seja visto como algo ruim.

A cada conto, um ponto

Tudo começou com uma audiência, em março, diante do subcomitê judiciário da Câmara dos Representantes. Heather Heidelbaugh, advogada de Pittsburgh, relatou que Anita Moncrief, ex-funcionária da Acorn, havia fornecido informações sobre problemas no grupo a Stephanie Strom, repórter do NYTimes. Heather, membro da Associação Nacional de Advogados Republicanos, processou a Acorn na Pensilvânia, alegando fraude no registro de eleitores, e Anita era sua testemunha.

A apuração da matéria parou de ser feita, revelou Heather, depois que Anita contou a Stephanie que a campanha de Obama deu à Acorn uma lista de doadores que haviam doado o limite máximo ao candidato, para que a organização pudesse solicitar ajuda a eles. ‘Stephanie disse à Anita que seus editores no NYTimes pediram-na para parar de apurar as informações, pois ‘influenciariam no rumo das eleições’’, afirmou Heather.

Troca de e-mails

A versão da repórter é diferente e comprovada por sua editora e por e-mails trocados entre ela e Anita – que não quis dar informações a Hoyt. Em setembro do ano passado, Anita escreveu à Stephanie informando que tinha as listas de doadores das campanhas de Obama e Hillary Clinton e que houve um ‘contato constante’ entre as campanhas e o Projeto Vote, grupo que defende o direito ao voto, afiliado à Acorn – cujo status não permite que se envolva com política partidária. Anita disse que havia decidido fornecer as listas ao NYTimes depois que a colunista Michelle Malkin, da Fox News, também as obteve. ‘Desculpe. Eu acredito em Obama e não quero ajudar os Republicanos’, teria escrito ela. Stephanie teria então respondido: ‘Eu adoraria as listas de doadores. Quanto a ajudar os Republicanos, eles já estão de olho nisto’. Estaria a repórter expressando simpatia por Anita, que estava triste pelo fato de prejudicar seu candidato? Ou então seguindo sua posição política, mesmo tendo pedido as listas? Ela diz não se lembrar o que a motivou há oito meses, mas diz ter cuidado em manter suas posições políticas em particular.

Depois de algum tempo, Anita enviou as listas, mas não havia nenhuma fonte para confirmar que eram realmente da campanha de Obama. A repórter disse que, finalmente, Anita concordou em falar fora do anonimato, mas surgiu um problema de credibilidade: ela tinha sido demitida da Acorn por usar cartão de crédito da organização para despesas pessoais. Antes de se encontrarem, a repórter conheceu outra fonte que lhe deu um relatório interno com detalhes sobre atividade política permissiva na Acorn e suas afiliadas. Uma matéria sobre isso foi publicada em outubro do ano passado.

Suzanne Daley, editora da seção nacional, chamou então a repórter para que ela fosse ouvir a versão de Obama. ‘Trabalhamos na pauta por um tempo, mas não conseguimos nada’, contou Suzanne. Ela nunca achou que a matéria interferiria nas eleições, no entanto.

Segundo O’Reilly, Anita teria deposto sobre o NYTimes sob juramento, no Congresso. Mas ela não testemunhou na audiência, e sim na Pensilvânia – e tampouco estava sob juramento. O deputado Republicano James Sensenbrenner, que pediu a Heather que testemunhasse, diz acreditar que a campanha de Obama e a Acorn claramente quebraram as normas e que, se o NYTimes tivesse publicado a matéria, eleitores poderiam ficar desapontados e o resultado das eleições poderia ter sido outro. Não é o que pensa Lawrence Norton, conselheiro da Comissão Federal Eleitoral de 2001 a 2007, que alegou duvidar que a comissão abrisse um inquérito sobre a acusação porque as evidências seriam especulativas e de difícil comprovação.