Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quando um não quer, dois não brigam

O artigo de Mauro Malin ‘Muita gente já não lê jornal do mesmo jeito. Viva!‘ (11/11) merece reflexões. Após ler o texto, concluí que, apesar de ter notado alguns equívocos no que li, a intenção do autor foi a de demonstrar respeito pelo leitor. Dessa maneira, submeto ao Observatório da Imprensa, respeitosamente, este texto, pedindo espaço para que seja publicado numa tentativa que farei de incentivar desejável bom senso e comedimento nos debates. Enfim, quero prestar um serviço ao OI, aos seus leitores críticos, aos discordantes e, sobretudo, à civilidade de cidadãos de bem que buscam, por caminhos diversos, o mesmo objetivo edificante de ver florescer a democracia no Brasil.

Malin, apesar de ter feito uma série de considerações a meu ver equivocadas sobre o discurso dos leitores que têm criticado o Observatório da Imprensa, abordou de forma não-inconformada e indignada a postura deles de criticar, ou, melhor dizendo, aceitou críticas ao OI e consentiu ante a possibilidade de que este pode até não fazer sempre as melhores escolhas… É um grande avanço e, a meu ver, o esboço de uma tentativa de diálogo. Por outro lado, cabe a mim, como um dos leitores críticos ao OI mais ativos, fazer uma reflexão sobre minhas críticas e as de vários outros. Aproveitemos, pois, o gancho de um momento de lucidez de ambas as partes.

Não posso prosseguir, porém, antes de apontar onde foi que Malin se enganou. Ele faz algumas considerações corretas, porém partindo de premissas açodadas e, a meu ver, insuficientemente refletidas. Assim, para essas considerações oporei uma visão alternativa dos fatos. Em seguida, quero tecer considerações sobre a postura crítica de tantos e tantos leitores do OI.

Pressão antidemocrática

O autor começa se equivocando ao afirmar que ‘alguns corifeus [regentes] do discurso sobre o `complô da mídia´ omitem sistematicamente, em suas análises, as malfeitorias do governo e do PT. Falam apenas das maléficas intenções das elites mancomunadas com a mídia, ou vice-versa’.

Ora, Malin se equivoca e, usando de ironia ferina, esquece de que não há nenhuma prova lícita de que as ‘malfeitorias’ a que se refere são de autoria ‘do governo e do PT’. O que se pode afirmar, sem medo de ser irresponsável, é que membros ‘do governo e do PT’ praticaram, inegavelmente, ‘malfeitorias’. Os leitores críticos do OI não se conformam que quando alguém do PT ou do governo age mal, para a imprensa a culpa seja daquelas instituições inteiras, e não de algumas das pessoas que as integram, mas quando é gente do PSDB ou do PFL, a culpa é individualizada. Essa é a grande questão que parece impossível de explicar aos que não querem ver o partidarismo da mídia que montes de jornalistas respeitadíssimos aceitam…

Por outro lado, há que pensar, os leitores críticos, que as decretações de ‘fim’ do OI e as promessas de abandono de sua leitura têm, sim, um quê de pressão antidemocrática. O OI não acabará enquanto permitir a discussão de idéias divergentes em igualdade de condições. Eu, por exemplo, crítico ferino, irônico e – concedam-me –muitas vezes quase cirúrgico, confesso que, sem perceber, talvez tenha resvalado para a intolerância ao também decretar o fim de um veículo que tantos serviços já prestou ao debate democrático de idéias. Não se pode condenar toda história do OI por um momento de igual radicalismo do também histórico Alberto Dines. Não se pode desqualificar uma vida por um dia ou um mês. E abandonar o OI, simplesmente, significa abdicar de debater. Não é por aí.

Alguns equívocos

O que de inteligente poderíamos tentar aqui no Observatório seria diminuir as desqualificações dos que pensam diferente. Dines e os vários jornalistas que têm vindo defendê-lo – bem como ao OI – poderiam parar de desqualificar os leitores dizendo-os, de forma simplista e ligeira, ‘petistas’; os leitores poderiam parar de qualificar meramente qualquer manifestação contrária como ‘tucana’. Somos todos homens e mulheres inteligentes que escrevemos bem, que concatenamos idéias com propriedade e, freqüentemente, com grande tirocínio. Afinal, o que estamos discutindo tanto aqui? A campanha eleitoral acabou. O vencedor da disputa pela Presidência desagrada a alguns e agrada a outros, mas o fato é que venceu e temos que assumir isso.

Pode ser inocência minha, mas quero propor um freio de arrumação no debate que temos travado aqui no OI. Proponho, daqui em diante, manifestações que tentem iluminar a cena inteira e não, apenas, parte dela. Esse maniqueísmo, esse tudo ou nada, esse pensamento binário não tem contribuído para o debate público que deve ser travado pelos cidadãos verdadeiramente interessados no melhor para o país. Eu acredito sempre no ser humano e sei que o melhor de cada um pode ser despertado com um gesto de boa vontade de uma das partes, pois, ‘quando um não quer, dois não brigam’.



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Mauro Malin, em suas respostas aos comentários, comete alguns equívocos, a meu ver.

1) Ao leitor Pedro Lima, que invoca o princípio constitucional de presunção da inocência também para petistas, Malin argumenta que Palocci e Dirceu foram demitidos por Lula, o que, em sua visão, seria condenação deles pelo presidente. Resposta: afastar auxiliares acusados até que tudo se esclareça não é condenação, é prática séria.

2) Ao leitor Paulo Silva, Malin diz que há que criminalizar todo o PT por conta de que os petistas envolvidos em escândalos eram da cúpula do partido. Resposta: Eduardo Azeredo era presidente do PSDB e foi flagrado com as digitais no valerioduto e ninguém da imprensa acusa todo o PSDB.

3) À leitora Luzete Pereira, para contestar a afirmação dela de que a mídia não noticia contra os tucanos como noticia contra os petistas, Malin aponta o fato de que a imprensa denunciou os escândalos tucanos por ela mencionados, do contrário ela não saberia deles. Porém, não leva em conta que a imprensa sumiu com esses assuntos em tempo recorde, mas manteve os escândalos petistas no noticiário. Além disso, o próprio ombudsman da Folha diz, neste domingo, o mesmo que a leitora.

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