Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Quem segura o microfone?

A cada semestre, centenas de jornalistas se formam no país. Mesmo sabendo das dificuldades para conseguir uma vaga no mercado de trabalho, da má remuneração (o salário inicial médio é de R$ 900,00) e da rotina estressante a que serão submetidos, esses jovens – com algumas exceções – escolheram o jornalismo por vocação, procuraram cursar uma boa faculdade, aprender idiomas e se especializar.

No último vestibular, a relação candidato-vaga para Jornalismo da Universidade Federal Fluminense foi de 23-73, na UERJ, 26-28 e para Comunicação Social, na UFRJ, 21-35. Segundo artigo de Carlos Castilho, publicado no site Observatório da Imprensa, em 2005 cerca de 60% dos jornalistas formados em universidades latino-americanas, após receberem o diploma, enfrentavam o desemprego ou iam trabalhar em outras atividades. Aí, o Supremo Tribunal Federal determinou, em 2009, o fim da obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão de jornalista. Mas a decisão não é definitiva. O Senado deve votar, nos próximos meses, a proposta de emenda à Constituição (PEC) que restitui a necessidade do diploma para quem quer trabalhar como jornalista. Enquanto isso não acontece, é preciso lembrar que, por enquanto, só o diploma caiu. A regulamentação profissional ainda deve ser registrada, previamente, no Ministério do Trabalho e Emprego. Quanto às normas e convenções coletivas, elas permanecem e precisam ser respeitadas.

Recursos para não gastar

Algumas emissoras de TV aberta ‘esqueceram’ desses detalhes e, como o diploma caiu, aproveitaram para derrubar também, por tabela, parte dos funcionários especializados. Telespectadores, amigos, mulheres-frutas, modelos, ex-BBBs, ex-fazendeiros, ex-dançarinos e candidatos a celebridades estão atuando como repórteres. Ou seja, as emissoras encontraram uma forma legal de ter mão-de-obra ainda mais baratinha. O jornalista, pelo sindicato da categoria, tem um piso mínimo. O estagiário também está protegido por uma rigorosa legislação trabalhista. Mas o ‘desformado’, essa nova profissão, pode ganhar qualquer ninharia. E a história vai mais longe. As emissoras informam que todos os ‘desformados’ recebem supervisão dos jornalistas das próprias emissoras. Será que eles estão ganhando um extra no contracheque para fazer esse controle de qualidade? Sim, porque isso requer tempo e ainda mais responsabilidade. Na hora em que uma besteira for ao ar, quem você acha que vai ser demitido? O jornalista ou o ‘desformado’? Provavelmente o jornalista.

Mas o desrespeito à classe jornalística e ao direito do cidadão ser bem informado vai mais longe. Certas emissoras reprisam as mesmas matérias até quatro vezes na semana ou até no mesmo dia. Não estou falando das suítes – que acrescentam mais informações às reportagens já exibidas anteriormente. Não. Falo das matérias que passam iguaizinhas, sem nenhuma novidade e que não foram nem reeditadas para se mudar, por exemplo, as imagens, acrescentar ou tirar uma sonora. Faltam pautas, bons jornalistas procurando emprego? Não, são recursos para o patrão não gastar com a folha de pagamento. Por que produzir novas reportagens, contratar mais editores, se exibir as antigas sai de graça?

Ideias estapafúrdias

Talvez algumas empresas de comunicação venham a cumprir a lei no momento em que sentirem a dor no bolso. Vamos ver como se comportam quando começarem a pipocar os processos por danos morais causados por erros de informações.

Até lá, o que o jornalista vai fazer? Proponho que ele também possa trabalhar em outras profissões. Por exemplo, como economista (está acostumado a fazer contas e tabelas para que o seu salário dure até o final do mês), enfermeiro (ele tem prática em fazer muitos plantões) ou psicólogo (atura, como ninguém, os altos e baixos da direção)… Sim, são ideias estapafúrdias. Mas também não é bizarro o que está acontecendo em certas emissoras?

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Jornalista e escritora