Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Radicalização eleitoral durante a Copa revive padrão Fla-Flu

Os insultos à presidente da República neutralizaram todas as emoções provocadas pelo hino nacional cantado à capela por 60 mil torcedores na abertura da Copa. Civismo sem civilidade é escárnio, fraude, embromação.

Aquele momento que se pretendia glorioso, inesquecível, resultou estúpido, degradante. Discordância se expressa no voto, não na vaia. Ao direito de manifestar-se deve corresponder o dever de respeitar o outro. Afrontar a chefe da nação equivale a afrontar o que ela representa – a própria nação.

Aqueles que entoaram – também à capela – o ultraje contra Dilma não merecem a democracia conquistada com tanto sacrifício. Não merecem a Copa cuja conta ainda não está paga. Não merecem a condição de cidadãos. Ricos, pobres ou remediados – não importa a classe social – são, antes de tudo, marginais: excluíram-se da comunidade moral e espiritual que se tenta construir há 514 anos nesta terra.

Faltou um gesto reparador: alguém deveria ter pedido desculpas à presidente Dilma Rousseff. A oposição, os presidenciáveis, os chefes dos demais poderes, a imprensa como instituição (embora jornalistas individualmente tenham reagido à altura), algum gesto ou palavra de repúdio deveria ter sido registrado.

Temporada de gala

O desagravo, em compensação, foi desastroso. Na pressa em atalhar os possíveis desdobramentos ou, pior, pretendendo aproveitar politicamente o episódio, o presidente Lula apelou para um recurso no qual tem sido exímio – o paroxismo. No caso, totalmente inapropriado. Ao acusar a imprensa de ser responsável pela criação do clima que produziu a injúria, o experimentado mitingueiro substituiu o natural sentimento de solidariedade com a vítima por uma fúria belicosa aleatória, muito menos eficaz.

A velha cantilena contra a imprensa esvaziou o clima de simpatia e colocou tudo no ringue eleitoral onde, geralmente, há pouco espaço para generosidades, galantarias e, sobretudo, bons modos.

Fazer da imprensa o bode expiatório de todos os males é uma tentação fácil, desgastada. Não traz votos e aumenta as tensões. Tensões é o que menos precisa o governo. No caso da Copa, a acusação aos meios de comunicação é flagrantemente injusta: têm sido bastante cooperativos e úteis ao governo. Mais rigorosos e exigentes, teriam evitado grandes vexames. Preferiram agir como promotores do “clima de Copa” e estão sendo regiamente pagos por meio do patrocínio das empresas públicas às suas coberturas.

Para deixar boas impressões e imagem (sobretudo no exterior), esta temporada de gala do futebol exige comportamentos à altura. Transformá-la numa briga de galos ou num Fla-Flu de várzea será um enorme desperdício.