COMUNICAÇÃO CORPORATIVA
Serpentes e Esqueletos
‘Quando o assunto é crise, os comunicadores empresariais quase sempre lembram uma máxima que diz ‘prepare-se: você ainda vai viver alguma’. Roberto de Castro Neves em seu livro ‘Crises Empresariais com a Opinião Pública’ divide essas turbulências empresariais em ‘ovos de serpente’, aquelas que estão em gestação em algum lugar da empresa e as do tipo ‘esqueleto’ que são as crises prontas para aparecer para a sociedade, principalmente para a imprensa. A crise produzida, em maio, pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) é um esqueleto no armário do governo paulista, pois todos, do porteiro de delegacia ao governador sabiam que ela ia explodir. O governador do Estado de São Paulo, Cláudio Lembo, como foi divulgado, sabia da performática revolta 21 dias antes dela explodir. Centenas de atentados e dezenas de mortes pensadas pelos comunicadores do PCC para virar imagem mundial nas redes de televisão e na Internet, quase da mesma forma que a organização neural de Bin Laden pensou em explodir em 2001 o World Trade Center, em Nova Iorque. O crime organizado brasileiro se politizou a partir do contato dos presos políticos dos anos 1970, em presídios como o Tiradentes, em São Paulo. Lá os bandidos oriundos da classe proletária e da classe média empobrecida tiveram aulas de estratégia e de agitação e propaganda com os militantes de esquerda, muitos deles intelectuais. Lá os assaltantes de banco ainda sem ideologia e códigos de valores discutidos e escritos começaram a aprender a fabricar os alimentos que saciam a fome da sociedade do espetáculo em textos como o de Fuerbach, que abre o seu livro ‘A Essência do Cristianismo’: ‘nosso tempo, sem dúvida […] prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser’. O reforço, ‘a pós-graduação’ em políticas e ações de comunicação e organizacionais, foi apreendido à distância com gente das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farcs), dos zapatistas e da Al Quaeda. Os fundamentalistas com certeza não lerem Guy Debord (‘A sociedade do Espetáculo’), mas a esquerda leu. O levante de maio organizado pelo PCC mostrou mais uma vez que o crime tem os seus mídia-trainings e já sabe usar a semiótica voltada para os objetivos da ‘má vida’, pequena expressão usada nas entrevistas pelo governador Lembo. Duas palavras que lembraram outra expressão que designa as prostitutas, ‘mulheres de má vida’, e que fizeram o governador parecer mais antigo do que verdadeiramente é.
Na semiótica do crime, os presidiários rebelados souberam usar as imagens. Sem palavras, eles subiram nos telhados dos presídios e penduraram alguns reféns de cabeça para baixo. Para reforçar a percepção de violência, eles bateram em outros pobres coitados com barras de ferro pontudas. Como em um gibi desenhado por Will Eisner, as histórias foram contadas por roupas, facas e armas más e outros símbolos de intenção maligna. A idéia de planejamento da narrativa da violência foi reforçada pela notícia dada pela Folha de S. Paulo (14 de maio) que revelou que o comandante supremo do PCC é um leitor voraz e entre os seus preferidos está Dante, o do Inferno. Em meio a tudo isso, as instituições públicas se mostraram lentas e desarticuladas. O governador Lembo agiu com presteza e transparência, mas pecou na forma – precisa aprender a comunicar-se melhor. Em todo caso transmitiu segurança. No mais a comunicação pública sofreu do eterno mal da desarticulação. Se tivesse sido diferente a autoridade não sairia chamuscada pelo fogo da disfunção cognitiva, em meio às chamas e péssima notícias por todos os lados.’
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