A mídia paulista e também a regional tem se ocupado extensamente da guerra na Rocinha. E não poderia ser diferente: o confronto entre os bandos, o medo que desabou sobre a cidade, a inoperância dos órgãos de segurança e, sobretudo, as palhaçadas estreladas pelo casal governante do estado não poderiam passar despercebidas. Além disso, o Rio sempre foi notícia, esta é sua sina. Mesmo depois de perdida a aura de capital.
O que chama a atenção na cobertura dos veículos além-Rio é a incapacidade para perceber que o ‘fenômeno Rocinha’, embora exiba uma dimensão eminentemente carioca, é, na sua essência, nacional.
A favelização das grandes cidades, a falta de políticas urbanas, a inoperância dos órgãos de segurança diante do crescimento exponencial do crime organizado e a corrupção galopante nas polícias e nos judiciários não são exclusividades cariocas. Rocinhas com as mesmas características da Rocinha-Mãe de São Conrado estão espalhadas pelo país. Na cidade de São Paulo existem Rocinhas talvez até maiores.
Mas não são vistas. As favelas do Rio estão nos morros e os morros cortam a cidade em todas as direções. Não podem ser escondidas, disfarçadas, mas obrigatoriamente exibidas. Em São Paulo as favelas estão na periferia e, como o próprio nome indica, é a região marginal, afastada do centro, portanto invisível. É preciso considerar também que as favelas cariocas, além de constituir conjuntos ou ‘complexos’, estão integradas fisicamente ou, quando mais distantes, facilmente alcançáveis pelos meios de transportes convencionais.
As Rocinhas cariocas não ‘falam’ com as equivalentes paulistanas, mineiras, baianas ou pernambucanas, mas se refletem através da televisão. Comunicam-se e se copiam. As diferenças são ínfimas e dizem respeito apenas aos modismos que absorvem das cidades-matrizes.
Os dois jornalões de São Paulo, apesar do nome que ostentam, consideram-se veículos nacionais, mas até hoje, passados quase 15 dias do início da guerra na Zona Sul do Rio, ainda não conseguiram enxergar a federalização da Rocinha. Constatam o que se passa na ex-Cidade Maravilhosa, cobrem os desdobramentos, mas não avaliam que a Rocinha é onipresente, está em toda parte.
Lulu e Dudu, tal como Fernando Beira-Mar, são retratados como decorrências locais e distantes. Há uma resistência em reconhecer o avanço das próprias Rocinhas, mais fácil e mais confortável deixá-las a 500 quilômetros de distância, frutos de condições e particularismos locais, do que perceber semelhanças, identificar processos e acionar os alarmes.
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