Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Separação não justifica corporativismo

A discussão sobre a proposta de criação do Conselho Federal de Jornalismo acabou pondo em pauta uma velha discussão da categoria que o Observatório de Imprensa retoma: ‘Jornalistas e assessores devem ter o mesmo sindicato?’ A meu ver, não, conforme argumentei no artigo intitulado ‘Jornalistas e assessores de imprensa: separação necessária’, publicado na edição de 1º de julho do ano passado deste site [ver remissão abaixo].


Da mesma forma parece pensar o presidente da Radiobrás, Eugênio Bucci. Na semana passada, segundo o jornal O Estado de S. Paulo, ele afirmou em debate sobre o CFJ que não concorda em tratar assessores e jornalistas da mesma forma. ‘São funções dignas, mas não podem estar numa mesma associação nem ter o mesmo código de ética’, reproduziu o Estadão.


Antes de tudo, o aprofundamento dessa discussão poderá ajudar a desfazer uma série de confusões que ainda pairam sobre o exercício da profissão tanto do jornalista que atua como assessor de imprensa quanto daquele que trabalha em redação. A falsa idéia de que basta circular entre os jornalistas para ver as pautas nas mãos de um assessor emplacarem em algum veículo ainda persiste em alguns meios, embora tenha sido cada vez mais combatida pelo crescente profissionalismo dos dois lados. Um preconceito residual com a função de assessor de imprensa faz com que alguns jornalistas tratem qualquer assessor como se fosse um serviçal seu, sem estabelecer no mínimo diferenças entre os profissionais. Outros, pelo mesmo motivo, não conseguem distinguir uma trajetória com atuação ética de outra não-ética.


Ao colocar cada função sob o regime de entidades diferentes, poderão ficar mais transparentes para a sociedade atribuições, limites e responsabilidades de cada uma delas.


As prerrogativas de liberdade para o exercício da profissão jornalística, que a imprensa repetiu exaustivamente nestas últimas semanas com razão, não se aplicam ao assessor de imprensa. Por mais estratégica que seja a atuação de um assessor, sua liberdade fica confinada aos limites estabelecidos pelo cliente. Em compensação, as responsabilidades são distintas. Enquanto a liberdade do jornalista esbarra na Lei de Imprensa, a do assessor limita-se a uma cobrança ética, o que não é pouco, a exemplo do código de ética aprovado pela Agência Brasileira das Empresas de Comunicação (Abracom), entidade que congrega as agências de comunicação corporativa (www.abracom.org.br/down/codigo_etica.pdf.).


Reservas de mercado: condenáveis


Podemos dizer que o assessor de imprensa de um político deve seguir as mesmas normas que o profissional que faz a cobertura da política nacional? A resposta será sim, se admitirmos que o assessor de imprensa está submetido às regras legais que a Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) reivindica e, no outro extremo, o Conselho Federal de Relações Públicas (Conferp) contesta, apoiando-se na Lei 5.377, de 11/12/67, para argumentar que assessoria de imprensa é uma atividade de relações públicas (www.conferp.org.br).


No mundo atual, fragmentado e interdependente, em que nossa vida profissional se desenvolve, a ética parece tornar-se imprescindível para torná-lo sustentável, quanto mais no ambiente político. Porém, como a filosofia tem nos ensinado, seu pleno exercício demanda uma sustentação de ordem legal que o conflito entre a prática dessas duas entidades sugere não existir. Cabe a um estudo jurídico acurado confirmar.


De qualquer forma, não creio que o corporativismo, seja do lado do jornalista ou do relações públicas, possa suprir a eficiência e as habilidades requeridas por um assessor de imprensa para a sua sobrevivência na realidade atual e futura do mercado. Em tempos de decréscimo do número de empregos com carteiras assinadas e valorização da cultura do empreendedorismo, as reservas de mercado são condenáveis. Nesse cenário, parece muito mais adequado um ambiente não restritivo, em que o profissional com formação em alguma área de comunicação e mais capacitado para uma determinada função seja o escolhido para desempenhá-la.

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Diretora da agência de comunicação e relacionamento corporativos Hartz – Comunicação com Identidade