Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Só a mídia pode convocar um pacto nacional

A segunda-feira negra aconteceu há duas semanas, o governo do estado de São Paulo continua atarantado, sem saber o que fazer e, o pior, recusa-se a prestar contas à sociedade sobre a matança de inocentes que se seguiu ao motim do Primeiro Comando da Capital (PCC).


O Senado finge que está preocupado e vota um pacote de leis avulsas, sem costura ou sentido. Na Câmara dos Deputados, flagra-se um funcionário terceirizado que entregou documentos sigilosos de uma Comissão Parlamentar de Inquérito a um advogado-bandido e assim completa-se o arco que junta a corrupção política com o crime organizado.


A sociedade está intranqüila e perplexa: indigna-se, mas duvida das autoridades e dos políticos com suas promessas vãs. Os candidatos esbravejam, a mídia reproduz com alguma fidelidade tudo o que dizem, mas não consegue mediar, funciona apenas em um sentido: de cima para baixo. A mídia não consegue sensibilizar o sonar palaciano e o radar político dos andares de cima para o pânico que domina o seu público nos andares de baixo.


Além disso, há a Copa do Mundo, com sua infinita capacidade de abafar, desviar e disfarçar qualquer problema que não esteja diretamente ligado à conquista do caneco do hexa.


Neste panorama, soa como ironia os indícios de que talvez, em algum momento, provavelmente depois das eleições (portanto, em 2007), o PT e o PSDB resolvam conversar. Ironia, porque são balões de ensaio, desprovidos desta substância imprecisa e vaga que ficou conhecida como vontade política.


A hora da ação afirmativa


Aturdida por sua própria estridência, preocupada com as mudanças cosméticas e diminuída por uma competição mesquinha, nossa mídia não percebeu que esta é a hora de uma ação afirmativa, generosa e empolgante. Das Diretas até hoje, jamais houve oportunidade igual para que a imprensa demonstrasse a sua vontade de influir e mudar.


É alentadora a notícia de que o presidente Lula, se reeleito, pretende aproximar-se do PSDB. Mas faltam pelo menos duas perguntas candentes que só uma imprensa responsável e firme será capaz de fazer:


** Por que não agora?


** Por que não colocar a questão do combate ao crime organizado como prioridade nacional?


A Máfia começou a ser encurralada na Itália quando os partidos, todos os partidos, decidiram considerar a guerra ao crime organizado como emergência. O gangster Al Capone só foi preso quando a Receita Federal americana e o governo do estado de Nova York resolveram cooperar.


Só a mídia, na sua condição de vocalizadora dos sentimentos populares, tem legitimidade e ressonância para fazer este tipo de convocação. Só ela, porque teoricamente apartidária, tem a credibilidade para empurrar os partidos para um tipo de entendimento que não beneficia nenhum deles em particular, mas fortalece o Estado.


Qualquer que seja o seu formato, qualquer que seja o seu nome, quaisquer que sejam seus protagonistas e as regras que deverão regê-la é imperioso que esta aproximação seja uma iniciativa da imprensa. Para que ela possa fazer as cobranças. Para que o seu público perceba que nela pode confiar.