Nas eleições presidenciais brasileiras de 2006 parece ter havido consenso em relação à importância da internet nas muitas avaliações sobre o papel da mídia. O ex-presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (INTI), professor Sérgio Amadeu, por exemplo, afirmou:
‘O que ocorreu, em 2006, na relação entre internet e a política eleitoral? Os partidos políticos, boa parcela dos formadores de opinião e os cidadãos politicamente ativos e conectados criaram uma série de redes de disseminação de mensagens políticas por diversos meios virtualizados, principalmente sites de relacionamento, blogs, videoblogs e listas de discussão. Estas redes articularam simpatizantes e foram um meio extremamente veloz de respostas à mídia de massas e de disseminação de versões que logo migravam para o cotidiano presencial. Intensos debates foram travados nos sites de relacionamento e milhares de listas de discussão foram politizadas no cenário de 2006, pois repercutiam os embates trazidos de outros pólos do ciberespaço’ (in Venício A. de Lima, org. A mídia nas eleições de 2006; Ed. Fund. Perseu Abramo; 2007; p. 179).
Depois de 2006, veio o processo eleitoral nos Estados Unidos que culminou com a eleição do primeiro presidente negro de sua história. Barack Obama se utilizou largamente da internet, não só para arrecadação de fundos, mas também para a organização de voluntários e a mobilização de novos eleitores, sobretudo jovens. Sua campanha passou a ser vista como uma espécie de turning point em relação à utilização da web na política, inclusive no Brasil, independente das peculiaridades do sistema eleitoral americano e, claro, das imensas diferenças entre as nossas sociedades.
DataSenado e Vox Populi
Um ano antes das eleições presidenciais de 2010, duas pesquisas confirmam enfaticamente o crescimento indiscutível do papel e da importância da internet no processo eleitoral brasileiro.
O DataSenado divulgou, dia 2/10, uma pesquisa nacional que ouviu em setembro, por telefone, 1.088 eleitores, distribuídos pelas 27 capitais, com margem de erro de 3% para mais e para menos (ver aqui o relatório completo).
Os resultados (ver quadro abaixo) revelam que a internet (19%) já é o segundo meio de comunicação mais usado pelo eleitor brasileiro para informar-se sobre política, atrás apenas da TV (67%). Jornais e revistas aparecem em terceiro lugar, com 11% e o rádio é preferido por apenas 4% dos entrevistados. Além disso, quase metade dos eleitores (46%) acredita que a principal vantagem da internet nas eleições será a troca de informações e idéias. A possibilidade de facilitar a comunicação entre candidatos e eleitores aparece em segundo lugar, com 28%. Os entrevistados que disseram usar a internet diariamente somaram 58%; 78% acessam sites de notícias e 53% participam de alguma rede social, como Orkut ou Twitter.
A Vox Populi, por outro lado, por intermédio de seu presidente Marcos Coimbra, divulga em artigo publicado em dia 4/10 os resultados de pesquisa – também realizada em setembro – nas oito maiores regiões metropolitanas e no Distrito Federal, mostrando que a proporção de eleitores que usam a internet para se informar sobre política já chega a 36% (ver aqui). Informa Coimbra:
‘Quase dois terços dessas pessoas se informam exclusivamente em sites de notícias e blogs jornalísticos, enquanto que 7% utilizam somente as redes sociais, como Orkut, Facebook e Twitter com essa finalidade. Os 29% restantes combinam as duas possibilidades. São eleitores que acessam a rede com muita intensidade: cerca de 70% dos que procuram nela essas informações dizem que navegam `todo dia ou quase todo dia´ com esse intuito.’
Lições para todos nós
O que os dados mostram – e isso não constitui mais qualquer surpresa – é uma nova realidade da mídia no país. O presidente da Vox Populi comenta:
‘Como essas proporções [daqueles que se informam pela internet] só sobem ano a ano, é fácil perceber quão diferente vai ficando nossa sociedade política com o passar do tempo. A cada eleição, a internet aumenta de importância, como vimos já em 2008 nas eleições de muitas capitais, onde foi um elemento decisivo do processo de ascensão e queda de diversos candidatos. Em 2010, todo mundo espera que seja ainda mais relevante.’
A grande mídia tradicional, por óbvio, continua relevante, mas não tem mais nem de longe a importância na formação da opinião pública que a ela se atribuiu em passado recente. Nos processos eleitorais, sobretudo, essa importância deve ser totalmente reavaliada. Se compararmos a sociedade brasileira que fez ‘a primeira eleição presidencial moderna em 1989’ com a sociedade em que vivemos hoje, não há como ignorar a imensidão das mudanças ocorridas nas duas últimas décadas. Só não vê quem não quer.
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Pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília e autor, entre outros, de Diálogos da Perplexidade – reflexões críticas sobre a mídia, com Bernardo Kucinski (Editora Fundação Perseu Abramo, 2009)