NA JUSTIÇA
Kfouri vence ação contra ex-ministro do Esporte
‘O jornalista Juca Kfouri venceu hoje uma ação contra o ex-ministro do Esporte Agnelo Queiroz. O processo foi movido após um ataque desferido por Queiroz no programa ‘Fala Brasília’, da Rede Record, em 2005. Ele afirmou que Kfouri esteve a soldo de Pelé, quando este ocupava o ministério do Esporte, no governo de Fernando Henrique Cardoso. Primeiro, Kfouri propôs a retratação – não veio.
O juiz da Primeira Vara Civel de Brasília, Roque Fabrício Antônio de Oliveira Viel, entende que Agnelo Queiroz não conseguiu provar a acusação: ‘Se o réu afirmou tal fato, deve obrigatoriamente comprová-lo, em função de seu caráter ofensivo, o que não logrou fazer neste processo.’ Para o magistrado, ‘ele atribuiu ao autor falsamente a prática de conduta antiética e antijurídica, com o nítido intuito de denegrir a sua boa reputação de jornalista.’
O ex-ministro Agnelo Queiroz foi condenado a pagar uma indenização de R$ 25 mil, além de ‘arcar integralmente com as custas processuais e também com os honorários advocatícios’.
Em seu Blog, Juca Kfouri comemorou a decisão:
– Em tempo: havia prometido doar o dinheiro da indenização ao PCdoB, para que o partido formasse quadros melhores. Mas não só Queiroz saiu do PCdoB como, ainda por cima, os que o sucederam no ministério são do mesmo tipo, razão pela qual há que se concluir que o PCdoB não tem mais jeito. O dinheiro, portanto, será destinado ao escritório de advocacia que tem me amparado, pro bono, em questões semelhantes.
Leia um trecho da decisão:
‘Em suma, o réu afirmou que o autor teria pautado sua atuação, no período da gestão de Pelé no Ministério, como o jornalista a soldo do governo.
Trata-se evidentemente de acusação grave e que sem dúvida nenhuma macula a honra da pessoa ofendida, na medida em que retira sua credibilidade como jornalista – justamente o bem maior de que dispõe o jornalista perante os leitores: a credibilidade. (…)
(…)Na verdade, ele atribuiu ao autor falsamente a prática de conduta antiética e antijurídica, com o nítido intuito de denegrir a sua boa reputação de jornalista. Apesar de ter oportunidade para comprovar suas afirmativas, o réu não logrou êxito em fazê-lo.(…)
(…)Os documentos apresentados pelo réu não comprovam a veracidade de sua acusação.
O recebimento de pagamentos pela empresa do autor referentes à prestação de serviços de organização e gestão de evento esportivo não serve para demonstrar o pagamento irregular apontado pelo autor na entrevista.
Além disso, aqueles pagamentos envolveram as empresas do autor e de Pelé e foram realizados antes do ingresso deste no Ministério, além de ter justa causa evidente configurada pelo serviço prestado.
Ao contrário do que foi alegado na defesa, o réu não se limitou a dizer que faltava respaldo moral ao autor; foi além disso, afirmando que usou sua atividade jornalística para atender a interesses do governo a fim de elogiar o então ocupante do cargo de Ministro dos Esportes.
Quanto ao fax de fls. 77, não tem maior relevância.
O documento não indica que o autor recebeu verba oficial e nem que se comprometeu a elogiar o governo.
Na verdade, aquele escrito reforça exatamente a independência do autor como jornalista e seu total e completo afastamento de qualquer influência governamental, já que ele exalta e reforça sua atividade profissional independente, alheia a quaisquer compromissos.
Isso não quer dizer, por óbvio, que o jornalista não possa ter simpatia por atos do governo e por isso mesmo o desprendimento de elogiá-los quando com eles concorda.
Lembre-se que a proximidade do autor com Pelé no período anterior ao ingresso deste no Ministério era notória, chegando o autor inclusive a intermediar encontro de Pelé com o então Presidente eleito Fernando Henrique Cardoso para tratar da nomeação daquele para o Ministério.
Parece natural, portanto, que o autor tenha exultado, na época, a nomeação do ‘Rei do Futebol’ para o Ministério.
Isso, é evidente, não significa que ele recebeu dinheiro do governo ou do próprio Pelé com a finalidade de elogiar os atos oficiais.
Se o réu afirmou tal fato, deve obrigatoriamente comprová-lo, em função de seu caráter ofensivo, o que não logrou fazer neste processo.
A respeito da gravação apontada pelo réu em que o autor o teria ofendido, não tem qualquer relevância para a solução deste caso.
Primeiro, porque sequer houve pedido reconvencional. Segundo, não se sabe nem a data e o contexto em que foi veiculada aquela gravação.
Terceiro, pela transcrição de fls. 55, nota-se que a matéria não trouxe qualquer ofensa pessoal ao réu, limitando-se a divulgar que o relatório do TCU sobre a gestão do réu à frente do Ministério dos Esportes foi desfavorável.
Trata-se de dado objetivo e que não pode ser negado pelo réu.
Por isso, não há cunho ofensivo em sua veiculação.
Sendo assim, conclui-se que a entrevista concedida pelo réu se apresenta como ofensiva à honra do autor, atingindo sua credibilidade jornalística, não podendo ser considerada mera expressão de opinião.
Nestes termos, impõe-se o reconhecimento de que o réu é responsável pelos danos causados ao autor, de acordo com a regra do artigo 927 do CC.
Em relação ao dano moral, dispensa comprovação efetiva, pois existe in re ipsa. Decorre da mera verificação de que a vítima teve sua honra atingida publicamente pela expressão de opinião do ofensor.
Em relação ao valor da indenização, deve-se pautar pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, levando-se em conta os diversos aspectos objetivos e subjetivos da relação material.
No caso, não se pode olvidar que o réu exercia o cargo de Ministro dos Esportes, o que indubitavelmente confere maior gravidade ao ato, já que ocupante do primeiro escalão do Poder Executivo Federal.
Além disso, as ofensas foram veiculadas de forma ampla pela imprensa televisiva e escrita.
Por outro lado, o ponto central da agressão atingiu o maior patrimônio moral do autor, que é sua credibilidade perante os leitores.
Ressalte-se que o autor já exerceu cargos de destaque na imprensa, sendo o diretor da Revista Placar e goza de reputação muito forte no meio jornalístico, centrando sua atuação na crítica aos desmandos e imoralidades cometidas no meio esportivo.
Tudo isso indica que a ofensa causada pelo réu teve especial repercussão por envolver o jornalista Juca Kfouri, tendo o réu se aproveitado de sua condição de integrante do governo para atacar o jornalista que defende ética e moralidade nos gastos públicos no âmbito do esporte.
Em razão de tudo isso, fixa-se o valor da indenização em R$ 25.000,00, a serem corrigidos monetariamente pelo INPC e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, ambos a partir desta data.
Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE O PEDIDO para condenar o réu a pagar ao autor indenização por danos morais de R$ 25.000,00, com a correção monetária e os juros de mora já definidos acima.
Não obstante a sucumbência parcial, condeno o réu a arcar integralmente com as custas processuais (Súmula 326/STJ) e também com os honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor da condenação. Publique-se para o réu’.
Publicada em audiência. Intimados os presentes. NADA MAIS HAVENDO, encerrou-se o presente termo que, lido e achado conforme, vai devidamente assinado.
Dr. Roque Fabrício Antônio de Oliveira Viel, PRIMEIRA VARA CIVEL DE BRASILIA.’’
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