Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Tweet de dois gumes

Hora de se despedir dos ditadores analógicos, aqueles que faziam discursos absurdamente longos no rádio e na TV. Na geração dos autocratas 2.0, os pronunciamentos cabem em 140 caracteres porque todo ditador que se preze tem hoje um perfil no Twitter – seja ele verdadeiro ou fake.

As ditaduras migraram para o online, alerta o autor de The Net Delusion: The Dark Side of Internet Freedom (PublicAffairs, 2011), e a web não é porto seguro para cidadãos vivendo sob regimes opressores. Para o bielorrusso Evgeny Morozov, professor visitante na Universidade Stanford, na Califórnia, é verdade que em tempos de instabilidade política, como ocorre no Norte da África, a balança pesa para o lado dos manifestantes, que se aproveitam da internet para se organizar. Mas quando a poeira baixa – ‘e nem sempre o resultado será tão favorável quanto foi no Egito’ –, governos autoritários sabem usar a internet como instrumento de opressão, rastreando opositores e vigiando a opinião pública.

Líbia desconectada

‘A internet não está tendo um papel significativo na Líbia. Com ou sem a rede, manifestantes estariam transbordando para as ruas. Mas faz sentido que Kadafi tenha desconectado o país. O regime corre perigo e não é hora de gastar energia vigiando opositores online. Em tempos de estabilidade, ditaduras usam agressivamente a internet para fazer autopromoção, com a contratação de blogueiros pró-governo, vigilância, monitoramento das redes sociais, instalação de spyware nos computadores de dissidentes e ameaças a opositores via ciberataques. Autocratas criativos usam a rede para distrair a população das questões políticas. Para sorte desses líderes, a web providencia oportunidades maravilhosas de entretenimento que nos fazem esquecer nossas miseráveis existências. Imperadores usavam o `pão e circo´ – e existe muito disso online.’

Egito: primeira revolução digital?

‘Os manifestantes egípcios não eram avatares que aderiram a um grupo online antigoverno. Eles usaram a web para protestar no mundo real. Para alertar sobre os riscos da internet, circulou por Tahrir um folheto com dicas de segurança, como evitar distribuir informações sobre os protestos pelas redes sociais, que podem ser monitoradas. Vale notar que no Norte da África a penetração da internet não é alta. Mas o importante era pôr gente bastante nas ruas, atrair a cobertura da mídia tradicional e mandar um sinal à população de que o governo podia ser enfrentado. Os facebookers detonaram o processo; a TV e os celulares fizeram o resto. Mubarak ignorou o potencial político da rede e pagou por isso. Na Rússia e China, grupos de oposição que surgem nas redes sociais são deletados em poucas horas e os fundadores presos. Devemos celebrar o papel que a internet teve na Tunísia e Egito – estão dizendo que a primeira revolução pela internet foi a egípcia. Mas não podemos cair no discurso entusiasta de que a rede tornou o autoritarismo obsoleto. Não é verdade. E devemos ter em mente que nem sempre o resultado será tão favorável.’

China censura Google

‘Revoluções são eventos contagiosos. O governo chinês, com a experiência dos protestos de 1989 na Praça da Paz Celestial, não está disposto a assumir riscos – daí a censura a menções sobre o Egito no Google. Aliás, o monopólio das empresas de internet é um problema enorme para o futuro potencial do ativismo digital. Hoje, esse potencial está atrelado aos interesses do Google, Facebook e Twitter. E se um dia o Facebook decide que fazer dinheiro na China é mais importante do que dar voz aos dissidentes? Muitos deles já estão descontentes com a empresa por não permitir pseudônimos. Fazer com que essas companhias atuem com responsabilidade é um grande desafio, e acho que essa é a área que governos precisam focar quando discutem liberdade de expressão na web.’

Irã: repressão on e offline

‘Levando em conta a rapidez com que a tecnologia tem avançado, é decepcionante ver que o Irã ainda agride seus cidadãos mesmo com o mundo inteiro olhando. A morte da jovem Neda, amplificada pela internet, é um exemplo disso. Se o Irã estivesse preocupado com a imagem não mandaria franco-atiradores dispararem contra manifestantes com celular. Os ciberutópicos adoram falar das `escolhas´ que as tecnologias nos permitem. Tá bom, agora podemos escolher entre cem marcas de máquinas de café, mas também há cem opções que a polícia têm para nos rastrear. A internet traz um elemento de `poder ao povo´, mas esse não é nem o único fator nem o dominante. Não é o povo que lucra quando informações de milhares de pessoas são coletadas por corporações privadas que depois revendem essa informação para governos. Como acontece nos EUA. É hora de parar de falar apenas do lado cor-de-rosa e começar a confrontar o lado negro da internet, que tem sido pouco estudado.’

Cuba: um respiro para blogueiros

‘Odeio tentar adivinhar o que regimes autoritários pensam – eles não costumam agir racionalmente. Mas, em geral, quando governos autoritários retiram restrições de blogs populares, como o Generácion Y, de Yoani Sánchez, estão fazendo uma concessão para a oposição ou tentando mostrar que não têm medo dos blogueiros. Ou podem estar tentando saber mais sobre os leitores desses blogs. No caso de Yoani, o objetivo talvez seja mandar uma mensagem para o exterior.’

******

Jornalista