Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Último Segundo

CRISE POLÍTICA
Alberto Dines

Um ano de traições, 17:22 12/05

‘Começou exatamente há um ano com a divulgação do ‘vídeo da propina’ nas páginas de ‘Veja’ (nas bancas em 14/5/05), em seguida escancarou-se a perfídia de aliados como Roberto Jefferson, depois vieram os queridos companheiros gozando as delícias do valerioduto, a confissão de Duda Mendonça sobre as contas no exterior, o reconhecimento público da ‘punhalada’ e, quando parecia que o pior já havia passado, o tarefeiro Sílvio Pereira é acometido por um surto psicótico que reacendeu as velhas suspeitas. Para culminar, o fatídico Dia do Trabalho com a dupla deslealdade dos hermanos Hugo Chávez e Evo Morales.

Com tais amigos já não se necessita de inimigos mas a oposição ao presidente Lula resolveu exibir todo o seu potencial de perversidades e, ao invés de solidarizar-se com a agressão sofrida pelo país, junta-se aos dois caudilhos vizinhos para espezinhar não apenas o atual governo mas a dignidade das instituições e empresas nacionais.

Numa democracia e numa sociedade que se pretende civilizada, os embates políticos internos têm limites. As ameaças externas impõem-se às divergências internas.

Evo Morales está doidão: deixou de lado o relaxante chá de folhas de coca e preferiu cafungar o pozinho branco delas extraído. Seus vai-e-vens erráticos revelam um chefe de estado despreparado e desequilibrado.

Nestas dramáticas circunstâncias, o furor eleitoral deve ser imediatamente interrompido de modo a fortalecer os interesses nacionais.Os representantes brasileiros precisam sentar-se à mesa das negociações amparados pelo apoio maciço da sociedade. Não se trata apenas de recuperar o prestigio internacional mas de mostrar um país coeso, maduro que, no lugar de metáforas tolas, sabe agir com firmeza e tranqüilidade.

Desafiado não está sendo apenas o Itamaraty mas o cidadão brasileiro que investiu o seu FGTS nas ações da Petrobrás, confiou nos acordos internacionais e trocou a fonte energética da sua indústria (ou do seu táxi) pelo gás. Este cidadão confiava no poder coletivo, sem ele pode sucumbir a desvarios individuais.

O PSDB que se pretende um partido de intelectuais não pode ser atropelado e arrastado pelos furiosos coronéis do PFL que não têm nada a perder e, por isso, sempre apostam no pior. A ineficácia da política externa do governo Lula ficou evidente, seus pressupostos ideológicos são juvenis, mas esta não é a hora de torná-la ainda mais vulnerável.

Uma pausa para a solidariedade cívica teria a vantagem de tornar o quadro político-eleitoral menos assustador e, assim, espantar o fantasma de uma ruptura institucional que nos ronda com insistência desde maio de 2005.

Com um Congresso desmoralizado por sucessivos escândalos de grandes proporções, cabe às lideranças políticas ultrapassar os escombros da representação popular e costurar um mínimo de governabilidade e respaldo. Não para ganhar as eleições mas para chegar até elas.

Convém pensar nisso: é uma ilusão acreditar que as eleições de Outubro recolocarão todas as coisas no seu devido lugar. As coisas estavam no lugar quando se processou a transição de governo em 2002. Foi um momento exemplar da nossa história política. Mas a arrogância dos que entraram e o ressentimento dos que saíram, dividiram o país e jogaram por terra o esforço de duas décadas visando o estabelecimento de um mínimo de consenso – para resistir à ditadura e, depois, para construir uma sociedade mais justa e tolerante.

Foi um ano de traições e vergonhas e não apenas circunscritas ao PT. Este tipo de material é pegajoso, volátil, transborda com enorme facilidade. O processo de degradação tem uma dinâmica própria e uma capacidade de contágio muito maior do que o vírus outonal que neste momento derruba tanta gente em nossos principais centros urbanos.

A crise boliviana poderia ser uma oportunidade para recompor uma nação estropiada, envergonhada, dividida, descrente. E cínica. A coleção de traições deste ano perdido e imoral exige um mínimo de fidelidades e adesões.

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Folha de S. Paulo – 1

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O Estado de S. Paulo – 1

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