‘Imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados.’ (Millôr Fernandes)
O programa Canal Livre, da Band, entrevistou no domingo (5/4) o governador José Roberto Arruda (DEM), do Distrito Federal. Os entrevistadores e o governador não conseguiam esconder o clima de cordialidade visceral, bem diferente do que ocorre quando o convidado é do PT ou de qualquer setor ‘perigoso’ para os ‘defensores da democracia’ tupiniquim. Para virar conversa de botequim, só faltava a cerveja (ou o vinho) e os petiscos.
As perguntas, todas amenas e aparentemente surgidas de uma pauta elaborada pelo estagiário de plantão, eram feitas sorrindo, enquanto a câmera mostrava o entrevistado com os olhos brilhando e um sorriso mais largo ainda. Teatro de roteiro pobre, interpretado por péssimos atores.
Jornalistas desinformados
A principal pergunta que deveria ter sido feita, caso o programa fosse sério, tem origem numa investigação realizada pelo Ministério Público e divulgada há duas semanas (ver matéria do blog do Noblat).
O MP apurou que o amistoso Brasil x Portugal, disputado na cidade-satélite do Gama, em 19 de novembro, foi realizado através da contratação de uma empresa fantasma, a Ailanto Marketing Ltda. Para organizar a partida no Distrito Federal, que marcou a inauguração do estádio Bezerrão, o governador Arruda – que se afirma como ‘moderno’ – autorizou o pagamento de 9 milhões de reais a uma empresa cujo endereço fica no Rio de Janeiro e não possui sequer telefone.
Pior: Arruda desconsiderou um parecer da Procuradoria Geral do DF, que apontou as possíveis ilegalidades envolvendo a Ailanto. Mais: durante a conversa com os amigos da Band, Arruda elogiou enfaticamente a sua Procuradoria, citando-a como exemplo de ‘excelência’ do funcionalismo público. Nem diante da deixa perfeita, os entrevistadores – coitados, devem estar muito ocupados para se informarem – não perguntaram sobre este caso que, tal qual o balaio de escândalos do governo da tucana Yêda Crusius (RS), será abafado solenemente pela grande mídia (Leia sobre o caso aqui, aqui, aqui e aqui). Ou alguém tem dúvida disso?
Confissão
Durante a entrevista, Arruda também confessou aquilo que todas as pedras do Planalto Central já sabem: Gilmar Mendes, presidente do STF, fez o que a oposição no Congresso Nacional não havia conseguido até agora: chamou a atenção para a ‘ilegalidade’ e o caráter ‘revolucionário’ do MST.
De forma explícita e talvez involuntária, Arruda carimbou o ativismo político de um senhor que afirmou, quando advogado-geral da União (nomeado por Fernando Collor), em relação às revelações do Esquema PC Farias que desembocaram no processo de impeachment do seu presidente: ‘Isso não vai dar em nada’. (Veja as 25 perguntas formuladas por Idelber Avelar a quem é chamado de ‘Berlusconi brasileiro’.)
A Band, que gosta de afirmar a sua independência editorial, inclusive fazendo ataques à Rede Globo, mostra que tipo de ‘jornalismo’ pratica quando a pauta é a oposição ao governo Lula.
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Em tempo: José Roberto Arruda é o único governador do partido intitulado Democratas. O nome da legenda é ação de marketing que busca (sem sucesso) apagar a sombra reacionária de PFL, PDS e Arena, diante das seguidas vassouradas que levou nas eleições após o fim do reinado de FHC. Para se ter uma idéia do nível dessa decadência, o PFL passou de 1.028 prefeituras em 2000 para 790 em 2004 e 496, em 2008. Ou seja, perdeu mais da metade dos seus governos municipais em menos de uma década. E o governador Arruda é aquele ex-tucano que, junto com Antonio Carlos Magalhães, violou o painel do Senado e renunciou ao mandato para não ser cassado. Felizmente, para ele, a população do Distrito Federal é bem complacente.
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Jornalista, integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social; seu blog