Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Um território sem lei

A Folha de S.Paulo e o Correio Braziliense publicaram matérias de 10 a 12 linhas no último fim de semana sobre um contrato que firmei em setembro último com a Rádio Senado FM para a produção de um programa semanal chamado Jazz & Tal. Ele vai ao ar aos domingos às 20h com reprise às terças-feiras, às 23h.

Pensei que haviam encontrado alguma irregularidade no contrato – não encontraram porque não há. Imaginei então que abordariam algum possível conflito de interesses. Cubro política em Brasília desde 1982. Tenho um blog que fala de política. E escrevo uma coluna em O Globo às segundas-feiras sobre política.

As duas matérias não apontaram o conflito. Registraram apenas que não vejo conflito. E de fato não vejo. Quem me lê sabe quanto sou duro quando escrevo sobre os políticos em geral e alguns em particular. Na semana passada, em O Globo e também no blog, disse que o Congresso havia se transformado em um reduto de velhacos. Talvez eu tenha pesado a mão.

Respondo a processo movido pelo senador Renan Calheiros (PMDB-AL) devido ao que escrevi a respeito dele por ocasião do escândalo que por pouco não lhe custou o mandato. Também estou sendo processado pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) que não gostou de referências recentes que fiz ao seu nome.

Até setembro

Gosto de música, tenho uma coleção de mais de oito mil CDs e meu sonho de consumo era fazer um programa de rádio. Consegui realizá-lo na Senado FM. Entre março de 1999 e agosto de 2008, paguei do meu bolso todos os custos do programa. Foram 493 programas ao custo mensal de R$ 1.200,00.

Devo ser o único brasileiro que até hoje doou dinheiro ao Senado – R$ 135.600,00 (113 meses x R$ 1.200,00). Fi-lo porque qui-lo. Na época, era medíocre a qualidade de produção da rádio Senado. Não gostei do locutor nem do redator. Procurei uma produtora em Brasília – a Linha Direta. Ela cuida do programa. Gosto das coisas bem feitas e topo pagar por elas.

Em setembro último, sugeri à direção do Senado que a rádio arcasse com os custos do programa pagando diretamente à produtora. Do contrário eu o suspenderia. Disseram-me que não seria possível. Que o possível seria me pagar como pessoa física para que eu pagasse à produtora. E assim foi.

O valor mensal do contrato é de R$ 3.360,00. Descontados os impostos pela própria rádio (R$ 560,00 de INSS e mais R$ 560,00 de IR), e abatido o que hoje pago à produtora (R$ 1.750,00), resta-me por mês a fortuna de R$ 490,00. Pelo menos era o que eu pensava até há pouco. Alertado por minha mulher, descobri que ainda pago mais um imposto – o ISS.

Se minha remuneração fosse de R$ 490,00 mensais, precisaria manter o programa pelos próximos 23 anos para só assim recuperar os R$ 135.600,00 que gastei com ele. Vou completar 60 anos. Não sei se ainda viverei por tanto tempo. Sei que o programa sairá do ar em setembro próximo tão logo o contrato termine. Esta semana ele fará 10 anos.

Reputações destruídas

Pedi à direção do Senado que republicasse o contrato em seu site. Porque ele aparece ali em nome de Ricardo José Delgado. E meu nome é Ricardo José Delgado Noblat. Somente minha mãe me chamava de Ricardo José. E de Delgado nunca ninguém me chamou. Nada tenho a ver com a supressão do ‘Noblat’. Assinei o contrato com meu nome completo.

Quem escuta a Senado FM ou se interessa por jazz em Brasília sabe que tenho um programa. Quem acessa meu blog encontra ali uma estação de rádio chamada Jazz & Tal. Os leitores do blog tomaram conhecimento do contrato. Discuti o assunto com um jornalista da rádio Senado que o tratou como se fosse um novo escândalo.

O argumento da Folha para publicar a notícia, segundo ouvi de alguns colegas de lá, era o de que o jornal não queria ser acusado de me proteger. Mas me proteger de quê? O Correio dispensa pretexto quando enxerga uma oportunidade de me atingir. Tem a ver com desafetos que angariei na empresa quando o dirigi de 1994 a 2002.

Em blogs alinhados com o governo Lula ou que atacam o que chamam de ‘mídia golpista’, estou sendo apresentado como o novo mensaleiro da praça. Foi deflagrada uma campanha em parte da blogosfera com a intenção de me desqualificar. Jornalistas empregados do Senado estão furiosos porque mais de uma vez já disse que há jornalistas em excesso por lá.

Corre muito sangue na blogosfera. Destroem-se muitas reputações levianamente. É um território sem lei. Confesso que às vezes penso em abandoná-lo. Talvez o faça daqui a mais cinco anos.

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Jornalista