Monday, 25 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Um tiro na paz

Ganha manchetes em todo o mundo a ação militar do governo israelense contra os seis navios com ajuda humanitária que tentavam furar o bloqueio à Faixa de Gaza. Pela primeira vez, em décadas, a imprensa brasileira abandona a tradicional postura de apoio incondicional à posição de Israel.


Na mídia mais influente dos Estados Unidos e da Europa também ganham destaques as manifestações de condenação ao que vem sendo considerado, de modo geral, como uso desproporcional de força contra um grupo de ativistas desarmados a bordo de navios carregados com mantimentos e remédios.


O governo de Israel alega legítima defesa, mas deixa exposta a legitimidade do bloqueio que, segundo instituições humanitárias, tem provocado graves conseqüências à população palestina na região.


Paralelamente ao incidente, as reações abrigadas pela imprensa acabam por incluir na polêmica a questão nuclear, que até então tinha como ponto central o esforço internacional para impedir que o Irã venha a possuir sua bomba atômica.


A colunista Eliane Cantanhêde, da Folha de S.Paulo, questiona, explicitamente:




‘Se Israel tem a bomba e o Irã não, se Israel ataca pacifistas e o Irã não, se Israel não ouve ninguém para decidir atos assim e o Irã tenta um acordo, como é que Barack Obama e as potências vão demonizar um e ignorar o outro?’


Sem avanços


Incongruências e opiniões controvertidas são algumas das conseqüências que se espalham a partir dos atos de força. Dentro da frase da colunista há pelo menos um deslize: o governo do Irã também ataca pacifistas – executa opositores, massacra manifestantes desarmados e mantém presos três jovens americanos que, em busca de esportes radicais, atravessaram inadvertidamente sua fronteira.


Trata-se de um filme sem mocinhos, composto apenas de vilões e vítimas.


O bom senso há muito abandonou as ações de autoridades envolvidas no conflito, e os esforços pela paz na região não produzem nenhum avanço significativo há muitos anos.


Guerra midiática


A guerra midiática que eclodiu imediatamente após o incidente no Mediterrâneo, em águas internacionais, quase fica sem sentido diante da determinação de ambos os lados de partir para o confronto total.


Uma varredura nas edições de terça-feira (1/6) revela claramente que Israel vem perdendo apoio na imprensa. O incidente pode abalar suas relações com a Turquia.


Mesmo as alegações de que alguns ativistas atacaram os soldados com estilingues, divulgadas pelo sistema de informações pró-Israel, soam bizarras diante da desproporção dos armamentos.


A informação de que o objetivo central dos ativistas não era levar auxílio humanitário à faixa de Gaza, mas denunciar o bloqueio, também não ajuda o governo de Israel. Afinal, o bloqueio estabelecido por Israel, com ajuda do Egito, completa três anos neste mês, e a imprensa já tinha abandonado o assunto. Foi implantado para impedir os lançamentos de foguetes por parte de militantes palestinos contra a população civil que vive perto da fronteira.


Diante da reação dos jornais, fica evidente que os ativistas ganharam a batalha midiática. O bloqueio da Faixa de Gaza volta a dividir as atenções com a questão nuclear do Irã e a paz naquele mundo antigo parece ainda mais distante.


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Observatório na TV


O Observatório da Imprensa na TV apresenta na terça (1/6) o especial inédito ‘Brasília: Capital da Utopia – a Realidade’. Com a participação de jornalistas, historiadores e políticos, serão discutidas as relações da imprensa com os presidentes que ocuparam a nova capital desde 1961, os desafios da apuração jornalística na sede do governo central e a história dos cinqüenta anos da cidade futurista de Niemeyer e Lúcio Costa.


A partir das 22h, em rede nacional pela TV Brasil. Em São Paulo pelo canal 4 da NET e 181 da TVA. Pela internet, www.tvbrasil.org.br/observatorio.