Em época de previsões e futurologia, um interessante exercício de observação é fazer a perspectiva para a imprensa brasileira, na passagem para um ano em que terá de enfrentar alguns desafios interessantes. O principal deles continuará sendo sua relação com o governo federal. Depois de um ano no qual uma sucessão de denúncias originadas ou amplificadas pela imprensa produziu a maior série de quedas de ministros na história da República em tempos democráticos, o jornalismo corre o risco de ver essa pauta esvaziada com a anunciada reforma ministerial no primeiro bimestre de 2012.
Mas também pode ocorrer o contrário: um ou outro nome entre os futuros ministros é capaz de detonar novamente a sanha correcional, e então teremos um repeteco de 2011.
A diferença é que não será mais conveniente poupar a presidente da República, uma vez que com a reforma ministerial ela teoricamente terá rompido seus laços com o governo Lula da Silva, que a imprensa apontou como a origem de todos os malfeitos.
Faxina prévia
Interessados em promover a demonização de Lula ao nomear Dilma Rousseff como faxineira moral, os jornais também buscaram isolar a presidente de seu partido e de suas bancadas no Congresso. Com Lula finalmente “desencarnado” do poder, a imprensa terá que encarar o dilema sobre ser ou não ser inteiramente oposição.
O advento das eleições municipais torna mais complexa essa decisão, uma vez que nas principais capitais do país as forças oposicionistas, que são claramente mais do agrado da imprensa, andam fragmentadas. Mas pode-se apostar desde já que, onde não houver chance para os partidos de oposição, os jornais vão preferir o anódino PSD, que afinal não é esquerda, nem direita, nem centro – apenas um projeto de poder.
Com a consolidação da Lei da Ficha Limpa, já que desaparecem as dúvidas sobre sua aplicabilidade em 2012, abre-se a chance de uma pauta interessante assim que começar o processo de formação das chapas: a caça aos candidatos bandidos.
A reabilitação de Jader Barbalho, cuja volta ao Senado foi registrada com destaque pelos jornais de quinta-feira (29/12), é o corolário de uma queda de braço que colocou em lados opostos a vontade popular, que originou a lei de controle das candidaturas, e o Judiciário, que postergou a validade da nova norma.
A imprensa balançou entre a legalidade e o desejo da sociedade, sem dissimular sua contrariedade com a reabilitação de personagens como Barbalho, e em 2012 tem a chance de ajudar a fazer uma faxina prévia na política.
Riqueza e bem-estar
Outro desafio para o ano que começa é a questão econômica. Até a última semana de 2011, predominam nos jornais as análises pessimistas com relação às possibilidades de superação da crise internacional, principalmente depois de constatado que os bancos privados da Europa “sentaram em cima” do dinheiro recebido do Banco Central Europeu como ajuda para estimular o crédito.
Em vez de colocar os recursos à disposição do mercado, ajudando a aquecer a economia, as centenas de bancos comerciais que foram socorridos com dinheiro público preferiram depositar no próprio BCE, em troca de juros baixos mas seguros.
A atitude conservadora dos bancos privados, não prevista no programa de socorro das autoridades econômicas, projeta um agravamento da recessão no próximo semestre. Por outro lado, ao encerrar 2011 com a perspectiva de se consolidar na sexta posição entre as maiores economias do mundo, o Brasil segue produzindo boas notícias.
Mas os jornais parecem ter aprendido pelo menos uma lição nos anos recentes: as comemorações vieram acompanhadas de alertas sobre outros aspectos do crescimento econômico, como a necessidade de buscar o desenvolvimento sustentável, com o respeito ao meio ambiente e a redução das desigualdades sociais.
Pode-se dizer que a imprensa brasileira começou a entender, em 2011, que o Produto Interno Bruto mede apenas a criação de riqueza, mas não serve para avaliar a geração de bem-estar na sociedade.
Controle externo
Outra questão que movimentou os jornais, revistas e a radiodifusão foi a disputa entre o Conselho Nacional de Justiça e as entidades corporativas da magistratura. Com cautela, para não dar a entender que tomou partido, a imprensa pendeu discretamente para o lado dos corregedores.
A liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, reduzindo os poderes do CNJ, ainda terá que ser analisada pela Corte Suprema após o recesso, em fevereiro, mas a polêmica atravessa a passagem do ano e os principais jornais claramente se manifestam a favor do controle externo do Judiciário.
Acontece que o tema controle externo provoca calafrios nos donos das empresas de comunicação. Esse é outro assunto que vai desafiar as redações.
Que seja um bom ano para todos nós.