O primeiro debate entre os presidenciáveis foi chocho, chato, morno – por causa do horário, da extensão, das exigências legais cada vez mais restritivas, dos acertos entre os partidos e da falta de energia da emissora-anfitriã (Rede Bandeirantes) para impor um modelo televisivo mais dinâmico.
A repercussão foi ainda mais lamentável, diletante, desenxabida. Para começar: em seguida ao debate, na madrugada da sexta-feira (6/8), os portais de notícias ofereceram uma cobertura lamentável. Seguiram um confronto político como se fosse uma partida de futebol – lance por lance. Como ainda não dispunham das referências dos jornais diários e não contam com um quadro de comentaristas qualificados para analisar os fatos 24 horas por dia, simplesmente omitiram-se. Se é assim que pretendem esmagar os jornais impressos, podem desistir: vão perder de goleada.
A tentativa do UOL de apurar quem se saiu melhor foi bruscamente abortada. A votação evaporou-se subitamente. Para não desagradar os perdedores.
Assepsia opinativa
Depois da deserção na hora do acontecimento, vieram os maneirismos e os rapapés no dia seguinte. Os comentaristas de rádio, tevê e internet estavam cheios de dedos, constrangidos, sem jeito de expressar o que sentiram para não serem acusados de favorecer candidaturas. Na verdade, não queriam ser patrulhados. Por isso, juntaram-se para elogiar Plínio de Arruda Sampaio, o simpático candidato do PSOL – mais solto porque nada tem a perder – sem se importar com suas desnecessárias grosserias pessoais que distribuiu entre os pares.
No sábado (7), quando os jornalões finalmente começaram a comentar os desempenhos, o debate já era coisa do passado. Prejudicados por este súbito acesso de bom-mocismo foram os eleitores que esperavam dos jornais opiniões aferidoras, técnicas, abalizadas.
Dirão alguns que este tipo de ‘distanciamento’ – ainda que hipócrita – é mais aceitável do que ataques arrasadores. Falso dilema: assumir as responsabilidades críticas não é sinônimo de avacalhação. O público quer da mídia os elementos básicos para formar seus próprios juízos. Muitas vezes na direção oposta.
Opinar não transgride as normas de conduta jornalística, sobretudo quando se trata de colunistas, comentaristas ou analistas cuja obrigação é justamente acionar o veio crítico da sociedade.
O que os leitores abominam é o engajamento, o fanatismo e, principalmente, a falta de diversidade nos veículos e na mídia em geral.
Com os jornalões oferecendo agora esta pletora de opinionistas seria conveniente liberá-los para expressar opiniões de forma civilizada, urbana. A assepsia opinativa que se seguiu ao primeiro debate é enganosa e perigosa. Parece isenção, mas é subtração pois retira dos meios de comunicação sua função maior que é o estímulo à formação de juízos.
Observar sem ferir
A eleição será no dia 3 de outubro, há ainda cinco debates pela frente; registrar agora um reparo desfavorável porém respeitoso ajuda o processo, ajuda o candidato e ajuda o eleitor.
Dois jornalistas, altamente credenciados, mostraram que é possível criticar o desempenho de um candidato num debate sem atacá-lo impiedosamente ou confrontar suas idéias:
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Juan Arias, correspondente no Brasil do espanhol El País, não tem escondido em seus despachos e análises uma empatia com o presidente Lula e, evidentemente, com a candidata escolhida para sucedê-lo. Mas na edição de sábado (7/8), o veterano jornalista foi claro, incisivo, correto – e muito crítico:‘[Dilma Roussef] revelou sua inexperiência e seu nervosismo com titubeios, tropeços de linguagem, repetições e o suor no rosto. Serra, ao contrário, que já disputou dezenas de eleições legislativas e locais, dominou os assuntos, sentindo-se à vontade’ (ver ‘Tibio arranque en Brasil de los debates electorales‘).
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José Roberto de Toledo, mais jovem do que Arias, porém não menos tarimbado em matéria de cobertura política, está desenvolvendo um excelente trabalho estatístico para o Estado de S.Paulo e na segunda-feira (9/8) ofereceu uma valiosa contribuição para desarmar esta falsa isenção adotada pela mídia:‘Debate não é luta de boxe. A idéia de que um candidato só ganha quando leva o oponente à lona projeta o desejo mórbido de ver um deles deitado em uma poça de sangue. Ninguém vira eleição com um golpe só, nem aprende a debater do dia para a noite. A vitória de um candidato é sempre por votos, nunca por nocaute’ (ver ‘O debate e o nocaute‘).
Desinibam-se, senhoras e senhores opinionistas! Aprendam a observar sem ferir. A crítica é uma apreciação, parte inalienável do exercício jornalístico. Aprendam a discernir. Este é um hábito contagioso. Não se omitam, mas não exorbitem. [Texto finalizado às 19h25 de 9/8/2010]