Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Uma lição de irresponsabilidade

Foi irresponsável a denúncia da revista Veja publicada na sexta-feira (24/10), dois dias antes do segundo turno das presidenciais.

A informação de que a presidente-candidata, hoje reeleita, Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula sabiam das malfeitorias que ocorriam na Petrobras era suposição, mera hipótese sem qualquer sustentação factual. O único dado comprobatório relacionava-se com um fato notório: naqueles dias o doleiro Alberto Youssef continuava o seu depoimento sigiloso perante o juiz, procuradores do Ministério Público e delegados da Polícia Federal. O resto da denúncia da revista está sob suspeição até que a íntegra da delação seja conhecida.

Esta premissa é elementar, básica, jornalística e jurídica. Mas a questão infelizmente, não se resume a ela.

Há quatro semanas, preocupado com a inaudita exacerbação da disputa eleitoral, este Observatório da Imprensa resolveu encarar uma questão que parecia não estar nas cogitações da imprensa. ouvimos o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro José Antonio Dias Tóffoli, duas jornalistas, um cientista político, todos com larga experiência, que pareceram menos preocupados com a batalha campal que se desenrolava nos debates televisivos, na propaganda eleitoral gratuita, nas redes sociais, na blogosfera, nas casas, trabalho e rua.

Na mesma ocasião aventamos a hipótese de que o instituto da reeleição poderia ser o alimentador dos excessos, tanto assim que desde a adoção da elegibilidade de um presidente para novo mandato, pela primeira vez ela foi questionada.

O TSE acabou aderindo à preocupação manifestada por este Observatório e nos últimos dias puniu alguns excessos do vale-tudo – e até convocou representantes dos dois partidos que se confrontavam para desativar a tensão. O apelo funcionou no último debate, mas a estratégia da “desconstrução” sistemática contagiou decisivamente não apenas o processo eleitoral, mas também o modo de conviver: o “outro” passou a ser um inimigo.

O vale-tudo estimulou a revista Veja a fazer o que tem feito desde a deposição de Fernando Collor: acusar sem provas. A infração do semanário foi tão visível que desta vez o resto da mídia foi mais relutante em acompanhá-la. Não se justificam, portanto, as provocações para colocar a imprensa no ringue político e no banco dos réus. A decisão do TSE exigindo do semanário pronto direito de resposta não foi contestada, porém foi considerada abusiva a proibição imposta à Editora Abril de fazer propaganda da sua edição.

Neste momento estamos diante da oportunidade única de atender ao clamor universal por mudanças. Tudo nos empurra para avanços e aproximações. No caso da imprensa, a mudança depende de um tripé fundamental – pluralismo, transparência e respeito à Constituição. (Alberto Dines)

 

 

Ben Bradlee (1921-2014)

“Quando o jornalista desvenda a verdade com imparcialidade e consciência, não precisa preocupar-se com as consequências.” Quem disse isso foi um dos maiores ases do jornalismo americano na segunda metade do século passado, Ben Bradlee, falecido na semana passada aos 93 anos. Talvez a menos celebrada, porém a mais importante figura do escândalo Watergate denunciado pelo Washington Post, obrigou o presidente Richard Nixon a renunciar em 1974.

Bradlee simboliza a era de ouro do jornalismo independente. Antes do caso Watergate, enfrentou o governo publicando os supersecretos papéis do Pentágono sobre a guerra do Vietnã. Liberal na ação e desengajado na retórica, era adorado pelos repórteres que tratava com rigor e também queridíssimo dos donos do jornal que converteu num dos mais prestigiados do país. Comportava-se como um lorde, mas na redação expressava-se como um moleque desbocado. Foi uma das últimas lendas do jornalismo romântico que na era das redes sociais seria apenas um meteoro fugaz, efêmero.

(A garotada pensa que os tuítes tuitam sozinhos.)