Os representantes dos partidos políticos estiveram reunidos na sede do TRE-RJ na quinta-feira (14/9) com o presidente da instituição, desembargador Roberto Wider, e de seus principais auxiliares, para conversar sobre detalhes da próxima eleição. A discussão esquentou ao ser tratada a novíssima resolução do TSE, a de número 22.332/06, publicada na terça-feira passada (12/9), que determina que os TREs de todo o Brasil – para aumentar a transparência do processo eleitoral – são obrigados a entregar aos fiscais dos partidos, no dia da eleição, nas secções eleitorais e ao fim da votação – até 10 cópias extras dos boletins com resultados emitidos pelas urnas eletrônicas.
O boletim impresso no momento em que também é gravado o disquete que a Justiça Eleitoral usa para totalizar os votos é o único documento oficial de que os partidos políticos dispõem para conferir se a soma dos votos feita pela Justiça Eleitoral está correta ou não. Isso porque os TREs estaduais, no mesmo dia (1º/10), por volta das 23h, têm obrigação de repassar aos partidos políticos que formalmente o solicitarem um CD contendo todos os resultados computados, urna a urna, usados na totalização.
Se o boletim impresso recolhido na secção eleitoral não ‘bater’ com o que está registrado no CD oficial, isto se torna prova indiscutível de que o disquete emitido pela urna eletrônica foi trocado no trajeto entre a secção eleitoral, onde é recolhido, e a Zona Eleitoral, onde é usado para alimentar a totalização de votos. Esse tipo de fraude já aconteceu no Rio de Janeiro e, por conta deste fato, classificado de ‘historinha’ na reunião dos partidos com as autoridades do TRE-RJ, corre inquérito na Polícia Federal para apurar responsabilidades que é acompanhado pelo Ministério Público estadual.
Mudança radical
Verificar a integridade dos disquetes usados na totalização é um dos itens para se ter segurança de que os resultados produzidos pelas urnas eletrônicas são corretos. Outras providências de fiscalização são necessárias, como acompanhar de perto as ações dos presidentes e mesários das secções eleitorais, no dia da eleição, já que sem vigilância eles podem substituir os eleitores e votar nas urnas eletrônicas.
Essa fraude é possível porque, com as urnas, eles recebem, também, a lista de votantes contendo nome do eleitor e número do título – a senha que disponibiliza a urna para receber votos. Se não houver fiscalização, se o presidente e os mesários forem desonestos, se juízes e fiscais partidários não prestarem atenção, votos podem ser colocados na urna, bastando digitar o número do título e votar. Nas eleições de 2000, no município fluminense de São Gonçalo, três vereadores não puderam votar porque alguém já tinha votado por eles nas respectivas seções eleitorais. Este tipo de fraude é muito mais comum do que se imagina.
O ministro Marco Aurélio – numa mudança radical da atitude do TSE, de tapar o sol com a peneira – aceitou a argumentação apresentada pelo PDT de que a posse do boletim de urna emitido pela urna eletrônica ao fim da votação é indispensável para que os partidos políticos possam fiscalizar a totalização. O argumento foi apresentado ao tribunal em junho por dois fiscais do PDT, o engenheiro Amílcar Brunazo Filho e a advogada Maria Aparecida, em petição para modificar decisão anterior do próprio TSE que impedia que os partidos tivessem acesso aos boletins.
Milho e pipoca
A necessidade de dar transparência ao processo de totalização de votos foi o argumento que Amílcar e Maria Aparecida, autores do recém-lançado livro Fraudes e defesas do voto eletrônico, usaram para mudar a decisão do TSE. O livro dos dois sintetiza a luta do PDT no TSE e também a luta do Fórum do Voto Eletrônico www.votoseguro.org – página da internet que reúne especialistas em informática e cidadãos em geral – para tornar as eleições brasileiras mais seguras. Argumento aceito pelo ministro Marco Aurélio.
A discussão esquentou na reunião do TRE do Rio de Janeiro porque os preparativos para as eleições já estão praticamente concluídos, faltando muito pouca coisa a ser feita a menos de duas semanas do pleito. Tanto o presidente do TRE-RJ, Roberto Wider, quanto o juiz responsável pelas urnas eletrônicas, Arthur Narciso, afirmaram desconhecer a decisão tomada pelo TSE publicada no dia 12/9. Mas ambos fizeram questão de manifestar a disposição do TRE-RJ de ‘contribuir ao máximo para a transparência’.
Os partidos políticos, por sua vez, manifestaram a preocupação de que todos os juízes eleitorais do estado sejam imediatamente informados da nova resolução do TSE e que não criem obstáculos para que os fiscais partidários coletem os boletins nas secções. O advogado Arthur Narciso manifestou sua preocupação de que as urnas não possam emitir os 10 boletins extras por falta de papel, enquanto Jayme Boente, corregedor-geral, sobre o mesmo assunto preferiu fazer uma comparação: ‘Enquanto houver milho (papel) teremos pipocas, quando acabar, acabou’.
Trabalho estratégico
No Rio de Janeiro, desde 2000, os boletins de urna vinham sendo recolhidos nas Zonas Eleitorais – o que para fins de fiscalização é inútil segundo os especialistas em informática – pelo comitê interpartidário criado com este objetivo. A resolução 22.154/2006 do TSE, do início do ano, determinava que as urnas eletrônicas emitissem apenas cinco boletins – um único destinado a partidos por intermédio do comitê interpartidário –, o que violava o Artigo 68 da Lei Eleitoral, a 9.504/97, que prevê a entrega dos boletins aos partidos que o solicitarem. Por isso, a decisão tomada pelo plenário do TSE, que acompanhou o voto do relator Marco Aurélio Melo, foi importantíssima, embora tardia.
O problema agora é tempo. Embora as urnas possam emitir os boletins sem maiores problemas, exceto a possibilidade de acabar o papel, é fundamental que os juízes, os funcionários da Justiça Eleitoral e os presidentes das cerca de 24 mil secções eleitorais do Rio de Janeiro – cerca de 410 mil em todo o Brasil – saibam que os fiscais credenciados pelos partidos estão autorizados a recolher os boletins nas secções mediante requerimento específico a ser apresentado aos presidentes de mesa, no dia da eleição.
A existência da cláusula de barreira nesta eleição torna estratégico o trabalho de fiscalização. Até porque os partidos dispõem de apenas 72 horas para contestar o resultado das eleições, seja ele qual for, e muitos estão condenados ao desaparecimento. É fundamental fiscalizar o pleito usando as aberturas disponíveis – que são poucas.
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Jornalista, fiscal e representante do Partido Democrático Trabalhista (PDT) no TSE, em Brasília, e no TRE-RJ