Uma das frases mais saborosas de nossa inculta e bela é ‘eu não disse?’.
Tres palabras, como no bolero, causam-nos espasmos orgásmicos de
incontido orgulho – e, sejamos sinceros, trazem nas entrelinhas outras três: ‘Eu
sou f…!’, não é?
No começo de agosto, o governo respirava feliz, uma vez que as pesquisas
mostravam que seu elevado índice de aprovação mal tinha oscilado, mesmo com os
escândalos a chover ‘coisa suja’ (segundo Ciro Gomes) sobre sua excelentíssima
cabeça. Num artiguinho neste Observatório (‘Pesquisas que radiografam o
‘povo’, 2/8/2005, remissão abaixo), mostrava graficamente a evolução dos índices
de desaprovação do presidente Lula, e alertava:
‘As margens de erro em torno de 2% e as tendências das curvas mostram que as
extremidades da escala (desaprovação/aprovação) estão em tendência de
aproximação, o que não é nada bom para as pretensões do candidatíssimo [no
caso, o Lula]’.
Pois não é que, decorridos apenas 20 dias, vejo no Jornal Nacional os
resultados da pesquisa do Ibope:
Aprovação/Desaprovação do Presidente Lula
Avaliação do governo Lula
A margem de erro é de 2,2% e, segundo a Folha
Online…
‘O resultado do Ibope confirma a tendência já apurada pelo Datafolha em
pesquisa divulgada no dia 12 de agosto último. Na pesquisa do Datafolha, Serra
aparecia num eventual segundo turno com 48% das intenções de voto e Lula, com
39%. A pesquisa Datafolha tinha margem de erro menor que a do Ibope, de apenas 2
pontos percentuais [nossa, que diferença!]’.
Na pesquisa do Ibope, o placar ficou Serra 44% x Lula 35%, curiosamente os
mesmos 4% a menos para os dois candidatos… Enfim, opiniões públicas são assim
mesmo, e os números dos institutos, como quase sempre, se aproximam.
Pela estrada afora
No Bom Dia, Brasil da manhã seguinte, o comentarista político
Alexandre Garcia já destrinchava mais os números, e realçava que a desgraça
(para Lula) não era pouca: simplesmente, Lula perderia as eleições em todas as
classes sócio-econômicas e em todas as faixas etárias!
Onde estão os ‘braços do povo’? Pelo expressivo sobe-e-desce das sobrancelhas
do comentarista, Lula já finou, e perde até dentro da torcida organizada do
Corinthians… Contudo, impávido colosso, Lula prossegue no ritmo frenético da
campanha eleitoral de 2006, como se nada disso ‘fosse com ele’. Não passa um dia
em que inaugure ou reinaugure alguma coisa, insistindo num estranho discurso em
que trocou as metáforas do ludopédio pela citação da sua (dele) figura materna
misturada ao papel de pai dos pobres, algo que talvez Freud explique.
Psicanálise não é minha praia, mas, para saciar a sede de previsões dos
leitores, consultei a délfica figura de Vovó Maria Conga que, depois de proceder
a uma análise da variância dos búzios e botar as cartas num espaço amostral
estratificado, vaticinou que a aprovação do presidente, ceteribus
paribus, vai descer mais um pouco, e estacionar nos históricos 20 e muitos
porcento.
Porém, ainda de acordo com a pitonisa do Parahybuna, se os jornais
prosseguirem na média de um escândalo por semana, e se Lula e o PT remanescente
não se livrarem de certas pessoas que fizeram ‘coisa muito suja’ (outra vez,
segundo Ciro Gomes), aí é que o bolo desanda de vez. E o Datafolha e o Ibope
podem prosseguir pela estrada afora, de mãos dadas e números paralelos, rumo ao
cataclísmico porvir.
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Engenheiro, professor do Departamento de Estatística da Universidade Federal de Juiz de Fora