Saturday, 30 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1316

WikiLeaks abre os arquivos e é criticado

Na sexta-feira (1/9), o WikiLeaks abriu todos os seus arquivos dos telegramas do Departamento de Estado norte-americano, quase todos sem censura – uma decisão que gerou a condenação veemente de grandes jornais que, no passado, colaboraram com os esforços do grupo anti-sigilo para expor corrupção e desonestidade. Muitos veículos, inclusive a Associated Press, já haviam tido acesso a todos, ou grande parte, dos arquivos não-censurados. Mas a decisão do WikiLeaks de divulgar os 251.287 telegramas em seu website torna particularmente delicadas as relações de fontes diplomáticas com qualquer pessoa ao serem contatadas. Autoridades norte-americanas advertiram que a divulgação poderia por em risco pessoas vulneráveis, como personalidades da oposição ou ativistas de direitos humanos.

Uma declaração conjunta publicada no website do Guardian diz que o jornal britânico e seus parceiros internacionais – o norte-americano The New York Times, o espanhol El País e o semanário alemão Der Spiegel – “deploram a decisão do WikiLeaks de publicar sem revisão os telegramas do Departamento de Estado, o que pode por fontes em risco”. O jornal francês Le Monde, que também publicou alguns documentos do WikiLeaks, assim como outros parceiros de mídia, também irá assinar a declaração, segundo a editora-executiva Sylvie Kauffmann.

Anteriormente, veículos da mídia internacional – e o próprio WikiLeaks – haviam revisado e suprimido os nomes de fontes potencialmente vulneráveis, embora esse padrão tenha variado e alguns especialistas tenham avisado que mesmo pessoas cujos nomes tivesse sido mantidos fora dos telegramas ainda assim corriam riscos. Agora, entretanto, muitos – e talvez até todos – telegramas divulgados no website do WikiLeaks traziam os nomes sem qualquer revisão, tornando fácil identificar dissidentes em países autoritários, como a Rússia, a China ou Mianmar.

“A decisão foi única e exclusivamente de Julian Assange”

Os membros da equipe do WikiLeaks não responderam aos inúmeros pedidos de comentários enviados nos últimos dias. Mas, numa série de mensagens pelo Twitter, o grupo parece sugerir que não tinha outra opção senão publicar os arquivos, pois cópias do documento já estavam circulando na internet após um vazamento na segurança. O WikiLeaks culpou o Guardian pelo erro cometido, ressaltando que uma senha confidencial usada para decodificar os arquivos foi revelada num livro publicado por David Leigh, repórter investigativo do jornal e colaborador – que se tornou crítico – de Julian Assange, fundador do WikiLeaks.

Mas o Guardian e Leigh, além de outros, rejeitaram a acusação. Embora a senha tenha, de fato, sido divulgada no livro de Leigh, publicado há sete meses, os jornalistas do Guardian sugeriram que o verdadeiro problema está no fato do WikiLeaks ter divulgado o arquivo codificado na internet, acidentalmente, e Assange nunca se ter preocupado em mudar a senha necessária para o abrir.

Na declaração conjunta, os parceiros internacionais do Guardian criticaram veementemente o ex-hacker de 40 anos de idade:

“Não temos como defender a publicação desnecessária de todas as informações – na verdade, estamos unidos ao condená-la”, diz a declaração, para acrescentar em seguida: “A decisão para publicar foi única e exclusivamente de Julian Assange.”

A suspensão do “site espelho”

A rejeição pelas organizações jornalísticas foi mais um golpe contra o WikiLeaks, cujo site está sob embargo financeiro e cujo líder permanece virtualmente sob prisão domiciliar numa mansão no campo, na Inglaterra, onde aguarda os trâmites do pedido de extradição feito pela Suécia sobre supostas agressões sexuais.

O WikiLeaks, um site anti-sigilo que se dedica a desmascarar corrupção e complôs, juntou-se, no passado, a parceiros da grande mídia para organizar e promover seus espetaculares vazamentos de informação confidencial – inclusive, documentos dos serviços secretos norte-americanos revelando detalhes sobre as guerras no Iraque e no Afeganistão.

Em meio à mais recente controvérsia, o grupo Repórteres Sem Fronteiras, que luta pela liberdade de expressão, disse que suspendera temporariamente seu “site espelho” do WikiLeaks. Esses sites funcionam como cópias em papel carbono de seus originais, aliviando a pressão devido ao tráfico intenso e preservando a informação em caso de ataque. Numa declaração, Repórteres Sem Fronteiras disse que não tinha “recursos técnicos, humanos ou financeiros para verificar cada telegrama” em nome de informações que poderiam prejudicar pessoas inocentes e, portanto, “tem que optar pela segurança”.

O Departamento de Estado norte-americano também condenou esta última divulgação.

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[Raphael G. Satter é jornalista da Associated Press]