Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Jornalistas latino-americanas renomadas lançam centro de jornalismo investigativo transnacional

Fundadoras do CLIP. (Foto: Divulgação)

Publicado originalmente no blog Jornalismo nas Américas

Cinco renomadas jornalistas latino-americanas acabam de lançar um novo projeto jornalístico que busca explicar com jornalismo investigativo colaborativo os fenômenos que atravessam fronteiras na região. O Centro Latino-Americano de Jornalismo Investigativo (CLIP, na sigla em espanhol) abordará temas transnacionais, como corrupção em grande escala e práticas ilegais ou antiéticas.

“A ideia do CLIP é estar sobretudo a serviço do jornalismo latino-americano”, disse Maria Teresa Ronderos, uma das fundadoras e diretora do CLIP, ao Centro Knight. “Vamos liderar projetos de colaboração transnacional de jornalismo investigativo e queremos buscar as pessoas mais qualificadas para trabalhar nessas coisas, mas também estamos ajudando a apoiar e desenvolver aqueles projetos que outras pessoas já estão cozinhando e que não conseguiram uma orientação, mas que são puramente colaborativos.”

Por trás do projeto estão as jornalistas argentinas Marina Walker Guevara, vice-diretora do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), e Emiliana García, diretora de La Voz de Guanacaste, na Costa Rica; a colombiana Ronderos, ex-diretora do Programa de Jornalismo Independente da Open Society Foundations; a costarriquenha Giannina Segnini, diretora do programa de mestrado em Jornalismo de Dados da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos; e a brasileira Natalia Viana, diretora da Agência Pública.

São jornalistas premiadas, que criaram seus próprios meios independentes de jornalismo investigativo, foram reconhecidas com importantes prêmios jornalísticos, como o Pulitzer e o Maria Moors Cabot, e participaram de projetos de treinamento e apoio a seus colegas do continente americano.

A ideia de um centro investigativo latino-americano surgiu em 2015, durante um curso jornalístico em Praga, em uma conversa entre Walker, Ronderos e Segnini. Elas prometeram se unir e criar o centro quando tivessem mais tempo para se dedicar a ele. Chamaram essa conversa de “pacto de Praga”, lembra Ronderos. Quando ela deixou a Open Society, no fim de 2018, as jornalistas se comprometeram a cumprir o pacto.

Segnini disse ao Centro Knight que, junto com colegas e outras organizações internacionais, elas notaram que não havia um lugar onde se pudessem centralizar os diferentes aspectos e etapas de suas investigações jornalísticas. “Não há ninguém como o CLIP – não porque não haja ninguém fazendo as coisas, mas porque ele é específico para buscar padrões por meio do uso de tecnologia, junto com aliados… Queremos encontrar mais Lava Jatos”, acrescentou.

“Nós realmente não queremos substituir nada que existe; muito pelo contrário, queremos somar a tudo o que já existe. Há pessoas fazendo um incrível jornalismo em toda a região e o que queremos é trabalhar com elas”, disse Segnini.

A equipe permanente do CLIP é formada por Ronderos como diretora, García como gerente, Rigoberto Carvajal como engenheiro de dados especializado em tecnologias e ciência de dados e pelo jornalista colombiano Andrés Bermúdez Liévano.

Embora o grupo esteja trabalhando desde maio, o CLIP lançou seu site em 12 de agosto com uma reportagem internacional feita em colaboração com outros quinze meios de comunicação de treze países da região. Transnacionais da Fé é a reportagem sobre a influência de grupos evangélicos sobre as elites do poder nos países do continente americano.

Ronderos disse que essa investigação começou dentro do projeto Columbia Journalism Investigations, do programa de mestrado em Jornalismo de Dados da Universidade de Columbia, dirigido por Segnini. Obtido financiamento da Atlantic Foundation, o CLIP começou a trabalhar no projeto, prestar apoio, coordenar, editar, “torná-lo realidade” e oferecer uma plataforma onde tudo poderia ser publicado, “apesar de que todo mundo publicou em seus meios de comunicação”, disse Ronderos. Alguns meios aliados começaram a publicar em junho e, o restante, em agosto, acrescentou ela.

Além do CLIP, participaram da reportagem colaborativa sites jornalísticos independentes como El Faro, de El Salvador; Agência Pública, do Brasil; El Surtidor, do Paraguai; Contracorriente, de Honduras; Mexicanos Contra la Corrupción y la Impunidad; Ciper, do Chile; Armando.Info, da Venezuela; Nómada, da Guatemala; La Voz de Guanacaste; o jornal El Tiempo, da Colômbia; o Semanario Universidad de Costa Rica e o jornalista Jonathan Castro.

Emiliana García explicou ao Centro Knight que, para o trabalho das futuras reportagens colaborativas que a equipe realiza, o CLIP terá seu próprio centro de dados para armazenar e compartilhar informações das investigações.

Por um lado, o CLIP tem a parte de coordenação editorial e investigativa, que é a maior área; por outro, o banco de dados, que ainda estará em processo por mais alguns meses. A ideia é “criar um tipo de centro comum de dados para facilitar as investigações para jornalistas investigativos latino-americanos, que possam entrar ali no futuro e encontrar facilmente muitas informações em um único lugar, com dados que possam ser usados e comparados entre países”, disse Ronderos.

Como exemplo, Segnini disse que vão começar a “coletar informações e dados abertos de toda a região para extrair e entender, e para ver padrões em termos de contratação administrativa e outros indicadores. Este será um serviço que queremos dar a todos que trabalham com o CLIP.”

O modelo de negócio do CLIP baseia-se, em princípio, nos fundos fornecidos inicialmente por organizações sem fins lucrativos, como a Atlantic Foundation e a Tinker Foundation, mas também na criação de um “braço comercial” que lhes permita capitalizar o conteúdo.

Como bolsista do Centro Tow-Knight de Jornalismo Empreendedor, García criou um plano de negócios “inovador e atrativo” para o CLIP, que a ajudou a pensar em estratégias de marketing e liderança. Segundo García, essa oportunidade de negócios baseada em seu conteúdo inclui a venda de produtos a partir de dados gerados, como relatórios para entidades e instituições; capacitação e treinamentos em dados; negociar a propriedade intelectual do conteúdo para que seja transformado em outros produtos, como filmes, livros, séries de televisão, documentários etc.

Dentro de um mês e no início do ano que vem, disse Ronderos, o centro publicará duas importantes reportagens colaborativas internacionais com o apoio da organização jornalística Organized Crime and Corruption Reporting Project (OCCRP, Projeto de Reportagens sobre Crime Organizado e Corrupção, em tradução livre).

As reportagens investigativas colaborativas e transnacionais “não são importantes, são indispensáveis”, disse Segnini. “Já não se pode investigar como fazíamos antes, como lobo solitário: é um desperdício de tudo, de recursos. Para começar, não se vê o panorama completo, (…) todos os grandes casos de corrupção que conhecemos, e que são cada vez mais numerosos, têm o mesmo comportamento. Ou seja, há uma receita e um padrão que eles replicam em todos os lugares”, concluiu.

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Paola Nalvarte é uma jornalista peruana que mora em Austin, Texas.