Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O fracasso da Nova República

Não será fácil nem rápido: na busca da verdade alcançamos, enfim, a esfera da consciência. Com as delações premiadas, o circulo vicioso chegou à derradeira etapa e, agora, diante da eminência de uma catástrofe, a opção é convertê-lo em ciclo virtuoso.

Hora de reconhecer erros e confessar enganos. Bater no peito, Penitenciar-se.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deu o sinal ao pedir à presidente Dilma que admitisse os equívocos ou renunciasse. A presidente soube captar a mensagem iniciando um rosário de pequenas e surpreendentes autocríticas. FHC foi adiante e na última terça, num encontro com empresários em São Paulo proclamou com todas as letras: “o sistema político brasileiro fracassou e somos todos responsáveis.”

A singela confissão e ao mesmo tempo a mais dramática constatação do fracasso da República Nova não tocou nas almas, ninguém se tocou. Publicada apenas no “Globo” não ressoou como deveria, mas na beira do abismo, aguçam-se os ouvidos. Na quinta-feira, o senador José Serra (PSDB-SP) publicou no “Estadão” um texto que pode ser entendido como complemento natural à sugestão de expiação coletiva proposta por FHC.

Animada profissão de fé parlamentarista, acompanhada por uma detalhada rememoração do seu torpedeamento na Constituinte pelos ambiciosos presidencialistas José Sarney, Leonel Brizola, Marcos Maciel e Orestes Quércia, o artigo contém hábil saída para minimizar os efeitos do terremoto provocado pela Operação Lava Jato: ao contrário do imediatismo e precariedade da experiência parlamentarista anterior (1961), o sistema só passaria a funcionar a partir de 2018. As investigações prosseguem, os culpados são punidos, mas estanca-se a crise institucional. Evitam-se traumas e, sobretudo, elimina-se para sempre a perigosa fermentação entre eventuais vencidos e vencedores. O fracasso foi de todos e todos começarão o novo sistema em pé de igualdade.

Apesar do irreversível desgaste da sua imagem, a José Sarney deve ser creditado o mérito de ter inaugurado, dias depois do segundo turno de 2014, a salutar opção confessional, pró-arrependimentos e remordimentos, através de um sonoro mea-culpa publicado na Página Três da “Folha”. Jamais deveria ter retornado à arena política depois de exercer a presidência, reconheceu. Ao mesmo tempo oferecia à presidente reeleita a magna tarefa de preparar o país para um maduro retorno ao parlamentarismo no decorrer do seu novo mandato.

Ninguém o leu, nem o levou a sério — esta talvez seja a verdadeira crise da nossa imprensa: só manchetes são lidas e percebidas. A Operação Lava Jato já estava em curso, ninguém poderia prever seus incríveis desdobramentos, mas a experimentada raposa política tão próxima do banquete pressentia aquilo que FHC identificou um semestre depois: o naufrágio do atual sistema político.

Hora de encerrar o perigoso jogo de exclusões chamado “Nós e os outros”.