Monday, 04 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Suecos fazem um apelo dramático

Há exatamente dois anos, um jornalista de uma rádio sueca foi assassinado no Afeganistão. No início desta semana, outra repórter de uma rádio sueca foi ferida durante um ataque contra um grupo de jornalistas na Rússia. O último ataque e a recordação do assassinato de dois anos atrás levaram a diretora-geral da Sveriges Radio [rádio sueca], Cilla Benkö, a pedir que a questão da segurança dos jornalistas seja abordada com mais seriedade [ela também faz parte da diretoria da União de Emissoras Europeias, participa do prêmio pela Liberdade de imprensa da Unesco e é membro da comissão diretora do International News Safety Institute – INSI]. Concordo com ela e estou publicando aqui seu apelo veemente na esperança de que alcance o maior número de pessoas possível:

“Basta de violência. Qualquer iniciativa de uma política que possa ser adotada para garantir a segurança dos jornalistas, aqui, na Suécia, e internacionalmente, através de órgãos como as Nações Unidas ou a União Europeia, deve ser posta em vigor agora. Esta é uma questão urgente, se queremos proteger a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão. Na quarta-feira (9 de março), nossa correspondente Maria Persson Löfgren foi atacada quando cobria uma pauta no estado russo de Inguchétia. No dia 11 de março de 2014, nosso correspondente na Ásia, Nils Horner, foi assassinado em Cabul. Dois acontecimentos absolutamente inaceitáveis. Tanto Maria quanto Nils estavam cobrindo pautas normais para um correspondente estrangeiro. É um trabalho que exige muito, é difícil e, às vezes, vinculado ao perigo.

A memorial to radio reporter Nils Horner.

Memorial em homenagem a Nils Horner / Foto Rádio Suécia

Nós deveríamos estar agradecidos por existirem pessoas que se querem envolver nesse tipo de jornalismo, pois é através delas que conhecemos uma realidade que, muitas vezes, é mais complicada do que sugerem aqueles que governam um país. A questão da segurança dos jornalistas deve ser tratada com mais seriedade no plano internacional. Parar de fazer a cobertura de regiões em conflito não é uma opção. Num mundo cada vez mais digitalizado, é muito fácil para grupos extremistas divulgar sua propaganda.

Sem jornalistas in loco, não imagens que se contraponham à propaganda, o que é exatamente o que os grupos extremistas – e, às vezes, regimes não democráticos – querem conseguir. Hoje, portanto, jornalistas de muito países tornaram-se alvos legítimos do ódio, de ameaças, de sequestros e, nos piores casos, de assassinato. Fico aliviada de saber que Maria e as outras pessoas do grupo com quem ela viajava receberam apenas ferimentos leves. Elas estão abaladas e emocionadas, mas o ataque poderia ter terminado de maneira muito pior.

Na Suécia, a liberdade de imprensa tem 250 anos

Durante o ano passado, 111 jornalistas e assessores de imprensa foram assassinados, segundo dados do International News Safety Institute – INSI. Já se passou muito tempo desde que os jornalistas podiam fazer seu trabalho a são e salvo, mesmo em condições difíceis e de perigo. Os números de 2015 confirmam uma tendência que, infelizmente, se tornaram a regra, e não a exceção. Mas os números do INSI também mostram que a grande maioria dos jornalistas que perderam suas vidas no ano passado eram jornalistas domésticos: jornalistas locais que passavam suas vidas tentando trazer perante a justiça as pessoas responsáveis por seus crimes, abusos de poder e corrupção.

É espantoso, e profundamente trágico, que quase todas as pessoas que desempenham essas ações o possam fazer em impunidade. Muito poucos são presos e muito poucos são punidos. Nove em cada dez autores de atentados ficam em liberdade. As Nações Unidas adotaram várias resoluções, mas não ocorreram mudanças significativas e a situação não vem melhorando. Pelo contrário, as coisas vêm se desenvolvendo na direção errada, como ficou claramente demonstrado pelo incidente de quarta-feira. Maria Persson Löfgren estava numa região em que jornalistas estrangeiros nunca haviam sido atacados. Isso acrescenta mais um local à crescente lista de áreas em que devemos pensar duas vezes antes de decidir se devemos enviar jornalistas.

Eu apoio a organização Repórteres Sem Fronteiras em sua exigência de que as Nações Unidas deveriam nomear um enviado especial responsável pela supervisão de questões que digam respeito à segurança dos jornalistas. Os correspondentes devem ter proteção contra ataques e tenho certeza que um enviado especial da ONU poderia significar um grande avanço, se gozasse da força de um mandato claro e forte. Além disso, também são solicitadas ações mais decisivas por parte de políticos, principalmente daqueles em democracias eficazes. Na Suécia, a liberdade de imprensa completa em 2016 250 anos. Esta é uma excelente oportunidade para que os parlamentares suecos levantem a questão da segurança dos jornalistas de maneira ainda mais consistente, em tantos fóruns e contextos internacionais quanto possível.

O monitoramento independente

Falar não é o suficiente. A ajuda externa sueca também poderia ser usada em apoio a organizações comprometidas em fornecer treinamento de segurança para jornalistas e seus colegas. Organizações essas que, devido a essa assistência, poderiam treinar jornalistas locais gratuitamente.

Além disso, questões sobre a garantia que um país tem de liberdade de imprensa e liberdade de expressão – assim como o número de jornalistas que foram mortos ou presos no país – deveriam ser abordadas durante visitas de autoridades oficiais.

A questão da segurança dos jornalistas vem afetando o mundo todo. A possibilidade de uma cobertura remota de áreas em conflito nos países dos próprios jornalistas não é uma opção. O monitoramento independente exige presença jornalística. Sem ela, corremos o risco de um futuro em que organizações que divulguem propaganda extremista ganhem legitimidade.”

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Roy Greenslade é professor de Jornalismo