Há oito anos, o jornalista Sandro Fortunato estreava na internet o Memória Viva, site que atualmente reúne algumas edições digitalizadas de antigas publicações brasileiras, como O Cruzeiro, O Malho e Careta, além de biografias de personagens importantes da história do país – e, a partir de terça-feira (4/9), o conteúdo do Pasquim.
O site nasceu da paixão de Sandro ‘por biografias e memória em geral’. No início, porém, era totalmente biográfico. Com o surgimento da web, em meados dos anos 90 Sandro percebeu que quase nada havia sobre cultura e história brasileiras na internet e resolveu dar sua contribuição.
Começou montando pequenos sites sobre algumas personalidades que admirava, como Luz del Fuego, Tancredo Neves, Grande Otelo, Wilson Grey, Jesiel Figueiredo e outros nomes ligados à cultura do Rio Grande do Norte, onde morava. Até que, em 2002, quando já morava em Brasília e colaborava na edição de uma revista da Secretaria de Informação e Documentação do Senado, teve que fazer uma matéria sobre os cem anos de nascimento de Juscelino Kubitscheck e encontrou apenas uma foto do ex-Presidente:
– Saí a campo e voltei com cerca de 150 imagens de Juscelino, boa parte conseguida em edições de O Cruzeiro. Durante a pesquisa, aproveitei e digitalizei parte dessas revistas com a intenção de utilizar como base para prováveis sites biográficos no Memória Viva. Mas isso mexeu com outra paixão minha: a história do jornalismo brasileiro. Tenho interesse pelo tema desde os tempos de faculdade e achei que seria interessante apresentar aquelas páginas que havia conseguido. Resolvi ler o livro Cobras criadas, de Luiz Maklouf, para entrar um pouco mais no mundo da revista. Durante a leitura, veio a idéia: ‘Por que não fazer uma versão online de O Cruzeiro como se ela ainda fosse editada? Um site dividido em seções, apresentando toda semana uma edição!’ E assim foi feito.
Todo o processo de digitalização e pesquisa do material disponível nos site é feito por Sandro, que algumas vezes contou apenas com o trabalho de uma digitadora. Ele diz que buscou acervos públicos que tivessem publicações antigas:
– Quase sempre esses acervos têm coleções encadernadas, o que é horrível para o processo de digitalização. Em geral, essas revistas são fotografadas em péssimas condições de luz. As imagens geradas são tratadas – este é o processo mais demorado – e escolho o que há de mais representativo para ser mostrado no site. As pesquisas, as viagens e tudo mais são bancadas com recursos próprios. Trata-se de um site pessoal e tudo é movido por pura paixão.
O Cruzeiro Online foi ao ar em outubro de 2003, um mês antes de a revista completar 75 anos de lançamento. Na época, Sandro fez uma edição virtual comemorativa, com a participação de várias pessoas que trabalharam nela ou em outros órgãos dos Diários Associados, como Murilo Mello Filho, que fez um texto especialmente para o site. Em março de 2005, foram lançados os sites de O Malho e Careta:
– Durante os primeiros meses de O Cruzeiro Online, as atualizações eram semanais. A idéia era que o visitante tivesse a sensação de que a revista estava chegando às bancas e, conseqüentemente, o site mostraria a edição da semana. Foi assim durante oito meses. Agora, em setembro, volta a ser atualizado semanalmente e vai seguir a ordem cronológica das edições que tenho. O Malho e Careta começaram da primeira edição e vão seguir a ordem cronológica. As atualizações desta revistas serão mensais a partir deste mês e quinzenais a partir do próximo ano.
Preservação
Sandro diz que o Memória Viva é um site de preservação histórica, que não tem patrocinadores e não gera qualquer lucro nem comercializa o que está disponível nele. Tudo o que sai publicado é devidamente creditado e só é disponibilizado após permissão dos detentores dos direitos de propriedade sobre o material:
– Tudo aquilo está ali para preservar nossa memória, nossa cultura. Se alguém quiser obter lucros ou utilizar para outro fim que não o de pesquisa, encaminho imediatamente aos detentores dos direitos. Não tenho idéia de quantas centenas de vezes fiz isso.
A digitalização do Pasquim foi possível graças à doação de exemplares de um colecionador de Juiz de Fora, que doou também as edições de Bundas e do Pasquim 21. Ziraldo, Luiz Carlos Maciel e Ivan Cosenza – este representando o pai, Henfil – já deram permissão para a publicação do conteúdo:
– Será possível pesquisar qualquer coisa que tenha sido publicada no Pasquim, através de um sistema de busca que vai permitir saber em qual edição saiu a entrevista com fulano, ou quais edições tiveram a colaboração de beltrano – entusiasma-se Sandro.
O Memória Viva tem cerca de meio milhão de páginas vistas por mês. Em média, cerca de duas mil pessoas acessam a página principal do site todos os dias. Para explicar o sucesso de audiência, Sandro diz que existe uma demanda de pesquisa histórica muito grande:
– Somos um país relativamente jovem, mas em algum momento teríamos que nos interessar por nossa própria História. Outro ponto importante é o fato de estarmos em um país de dimensões continentais. Para quem está nos grandes centros, como Rio, São Paulo e arredores, é mais fácil pesquisar e buscar acervos. Mas existe produção cultural, pesquisa e gente pensando do Caburaí ao Chuí. Hoje uma revista é lançada e, mesmo que tenha distribuição setorizada, vai chegar, no mínimo, a todas às capitais. Há 70 ou cem anos, isso não existia. É relativamente fácil encontrar edições de O Cruzeiro, da década de 50 em diante, em qualquer capital, mas a revista era uma potência! Outras publicações da mesma época e mais antigas quase que são encontradas somente no eixo Rio-SP. O Memória Viva muda esse quadro. O site dá acesso a um material que pode estar muito distante de quem está pesquisando. E ainda informa onde você vai poder pesquisar o acervo completo. Outro fator importante é a credibilidade. No meio do mar de besteiras que é a internet, o Memória Viva é um porto seguro – conclui Sandro.
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Repórter do ABI Online