Belo Horizonte, início dos anos 60. O cenário, a Redação da edição mineira da Última Hora, refletia com nitidez aquela agitada época. O jornal, num esquema que só poderia ter saído da fértil imaginação e da ousadia empresarial de Samuel Wainer, era editado em Belo Horizonte e impresso no Rio de Janeiro. Naquela época as ligações telefônicas interurbanas eram mais do que precárias, e o máximo de tecnologia moderna que contávamos era um incipiente telex. Comunicação por satélite era pura ficção científica, e o advento dos fax e dos editores de texto nem passava pela imaginação dos escritores.
Era uma loucura pautar, fazer a apuração e as fotos, redigir, editar e paginar o UH-BH praticamente todo na parte da manhã. E depois, à medida em que as páginas ficavam prontas, eram colocadas em malotes e enviadas às pressas para o Rio pelos DC-3 de carreira. No Rio, o jornal recebia o encarte das páginas nacional e internacional, e a primeira página era finalmente editada. Toda a edição saía da gráfica lá pela meia-noite e era enviada para Belo Horizonte de caminhão, que tinha que chegar nas primeiras horas da manhã na cidade. Volta e meia um dos caminhões, devido à alta velocidade e às curvas da antiga Rio-Juiz de Fora, mergulhava no Rio Piabanha e perdíamos toda a edição.
Nesse clima, a hora do fechamento da edição era indescritível. Cada segundo era mais que precioso. Era a hora dos telefonemas dos habituais chatos, querendo confirmação de notícias sem a menor importância ou passar informações sem interesse. E acertavam sempre a pior hora para ligar. Assim, na hora de fechamento ninguém atendia ao telefone de boa vontade.
O UH publicava no alto de sua primeira página a previsão do tempo. Todo dia o coitado do previsor ligava para o jornal na hora do fechamento, para passar a informação, e era um jogo de empurra. Quem atendia a ligação deveria pegar a informação e redigir, mas sempre na pressa, preferia gritar: ‘Fulano, telefone para você’, e assim por diante. E o funcionário do Serviço de Meteorologia tentava pacientemente que alguém se dignasse a anotar os seus dados.
Primeira página
Até que um dia de primavera, quando começa a temporada de chuvas torrenciais em Belo Horizonte, o meteorologista foi tantas vezes jogado para escanteio que desistiu. Na hora do fechamento, ninguém tinha redigido a indigitada previsão. A bomba então ‘ficou’ para um dos repórteres (vamos chamá-lo de Giovani; ele é hoje promotor público em Minas). O chefe de reportagem, é claro que aos gritos, determinou a Giovani que se virasse e arranjasse de qualquer maneira a informação.
Giovani ligou para a Meteorologia, o funcionário já tinha ido embora. Com a nossa experiência no assunto era muito fácil fazer uma previsão de tempo sem maiores riscos, ao estilo do antigo PSD mineiro, nem contra, nem a favor, antes pelo contrário. Do tipo ‘tempo bom, ventos de leste a oeste fracos a moderados, possibilidade de instabilidade no final do período’.
Mas o sangue italiano de Giovani não se fez de rogado. Apesar do céu absolutamente sem nuvens, com aquela intensa claridade que dera nome à cidade de Belo Horizonte, ele não resistiu e sua passionalidade falou mais alto: ‘Tempo bom, passando a instável com chuvas, forte possibilidade da ocorrência de uma tromba-d
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Foi repórter da Última Hora, edição MG, trabalhou no Correio de Minas e no Diário de Minas, neste último como editor de Economia